Com mais de 100 anos de história, é na minhota “Bracara Augusta”, Braga, mais precisamente, na Avenida da Liberdade, que este majestoso edifício, de nome Theatro Circo, se mantém aberto até aos dias de hoje. Aqui, celebra-se a cultura nacional e internacional, cinco dias por semana. Aqui, vive-se a música. Aqui, vive-se o teatro. Aqui, vive-se a performance.
Fotografia da cortesia do Theatro Circo
Costuma-se dizer que “mudam-se os tempos, mudam-se as vontades”… Ainda assim, o verso, do poema de Luís Vaz de Camões, parece não se aplicar neste espaço bracarense. Aliás, olhando para os números, com a ajuda do Paulo Brandão, atual Diretor Artístico do teatro bracarense, só nos últimos três anos esta casa acolheu cerca de 300 mil pessoas. Note-se que, em 2013, o número de espectadores estava na casa dos 30.000. Atualmente, fazem parte do edifício 50 funcionários, que vão desde a administração à limpeza. A sala de espetáculos possui cerca de 900 lugares, sendo que 90% dos espetáculos, nos dias de hoje, esgota imediatamente. Mas, mais que esta análise numeral, e como refere João Teixeira, em qualquer análise da vida cultural é impossível destruir o passado[1], é sobre este passado, repleto de triunfos e incertezas do Theatro Circo, que vamos refletir hoje.
De acordo com o texto “Memórias Musicais do Theatro Circo”, de Elisa Lessa[2], consta-se que, nos finais do século XIX e princípios do século XX, a cidade de Braga detinha uma intensa atividade musical protagonizada em diferentes espaços. Espaços esses como a capela da Sé ou, mesmo, os espetáculos no Teatro de São Geraldo.
É neste contexto que se inicia a construção do Theatro Circo, em 1906, pelos bracarenses. Projeto esse que se viria a tornar, segundo Elisa, “num dos maiores e mais belos teatros da cidade”. Na altura, o local escolhido para acolher o projeto pertencia aos terrenos do Convento dos Remédios. Assim, a igreja e os restantes edifícios da congregação foram demolidos para dar lugar a uma nova zona da cidade. Aliás, desde a demolição dos edifícios que corre o mito de que o teatro está assombrado pelo fantasma de uma freira do antigo Convento dos Remédios… Mas, calma, até hoje não há confirmação da suspeita.
Fotografia da cortesia do Theatro Circo
Outra curiosidade passa pelo nome do Theatro Circo, que se encontra escrito assim, ainda hoje, na fachada principal do edifício. Antigamente, era comum os circos virem animar a vida cultural da cidade. O palco principal chegou mesmo a ser uma das passagens de acesso para os animais de circo.
A inauguração oficial acabou por ocorrer a 21 de abril de 1915 com a estreia de cinco espetáculos de opereta. La regginetta delle rose (Rainha das Rosas) do compositor italiano Ruggero Leoncavallo (1857-1919), regida pelo Maestro Assis Pacheco foi a primeira obra a ser levada à cena pela companhia de Teatro Eden de Lisboa, dirigida por Luís Gallhardo.
Já em 1999, o Theatro Circo iniciou o seu processo de remodelação, que viria a mudar por completo a sua história. Para além da sala principal, com lotação de 897 lugares, o equipamento foi complementado com duas novas salas: um pequeno auditório com 236 lugares e uma sala de ensaios. Foi, ainda, aumentada a capacidade nas zonas de apoio com a dotação de novos camarins e armazéns. A requalificação incluiu, ainda, a reposição da traça original do Salão Nobre, libertado agora das alterações que foi sofrendo ao longo dos anos.
Fotografia da cortesia do Theatro Circo
Todo este processo culminou a 27 de outubro de 2006 com a reabertura do Theatro Circo, que, desde a data, nunca mais parou de crescer. Desde aí, passou a ser gerido por uma empresa municipal detida a 100% pelo município de Braga.
Paulo Brandão faz parte desta casa há mais de 11 anos. Explica que, atualmente, o Theatro Circo “trabalha muito a área da música (40%), e as outras áreas do espetáculo (60%)”. A isto, acrescenta que, “no verão, temos um ciclo chamado a Máquina de Gelado, que é um ciclo dedicado às músicas do mundo; temos o ‘Musa’, um ciclo onde só apresentamos mulheres e criativas; temos o ‘Respira’, que junta pianistas, compositores e intérpretes, e temos, também, o ‘Gente sentada’, o ‘Semi Breve’, ou o ‘Dança com os Pés’. É esta diferença que nos move”.
Fotografia disponível via facebook Paulo Brandão
Quando questionado sobre o sucesso, para o diretor, a resposta é clara. “Ele tem uma programação eclética. Toca em muitas áreas. A sala, só por si, tem imenso valor. A qualidade com que apresentamos os espetáculos, a nível técnico, somos muito exigentes. [Queremos] que tudo brilhe. E a programação que é para a cidade, mas acaba por ser uma programação apelativa, de qualidade, mas atenta. Como alguém disse, o público do Theatro Circo é um público muito talentoso.”
Ainda assim, admite que “falta muita coisa a esta casa, já que se não criarmos coisas desafiantes, estagnamos”. Esta ideia de mudança acabou por surgir, precisamente, com a chegada da pandemia ao território português. Apesar da “boa” readaptação ao online, não esconde a felicidade de encerrar este capítulo. “Vamos lançar um livro em outubro com a história do Theatro Circo de 2006, até 2020, com toda a parte gráfica, para fecharmos esse ciclo.”
Fotografia disponível via facebook Theatro Circo
Confessa que o ano de 2022 será o ano da mudança. “Após a pandemia, o público vai ser outro. Vamos ter de aprender a fazer algumas coisas de novo. Acredito que, quando for possível uma normalidade, vamos ter força para melhorar as coisas. Há muito para fazer. O Theatro Circo veio para ficar”.
* O artigo do Theatro Circo surge a propósito da parceria entre o Gerador e a Braga 27´(Capital Europeia da Cultura).
[1] (Lopes, João Teixeira (1999). Do Porto Romântico à cidade dos centros comerciais. Breve viagem pelo tempo, p.27)
[2] “Memórias Musicais do Theatro Circo”, Elisa Lessa, 2016, p.149