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Vamos mudar a cidade?

Desperto com uma notícia do El País, periódico que acompanho há vários anos, sobre o…

Texto de Redação

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Desperto com uma notícia do El País, periódico que acompanho há vários anos, sobre o Museu de Arte Contemporânea Helga de Avelar, em Cáceres, que nos diz que os bilhetes para entrada neste novo equipamento estão esgotadas até maio de 2021, no que tem sido um rodopio desde a sua abertura a 26 de fevereiro do presente ano, em pleno contexto pandémico, o que induz restrições. Conhecemos Cáceres como uma das cidades monumentais mais bem conservadas do mundo, preservando patrimónios e memória que cruzam séculos de História. O seu centro histórico, a “Cidade antiga de Cáceres”, foi classificado como Património da Humanidade pela UNESCO em 1986, sendo que em 1968 já tinha sido declarado o terceiro Conjunto Monumental Europeu, depois de Praga e Talim.

Tendemos, ainda, a manter uma visão neoconservadora do que devem ser os centros históricos, sendo resistentes ao contemporâneo, ainda que esse contemporâneo, que esse novo, respeite as evidências do passado mas delas saia em disrupção para introduzir o futuro nos territórios e continuar a garantir que o interesse não estagna e não se reduz ao que já foi. E, em Cáceres, o conceituado arquiteto Emilio Tuñón (n.1959) arriscou agregar ao anterior edificado conhecido como “Casa Grande” (uma obra modernista, eclética e de pendor clássico, finalizada em 1910 com projeto do arquiteto Francisco de la Pezuela y Ramirez), nos limites do tal centro histórico, a audácia da vanguarda num novo edifício. Os museus são, desde a década de 1980, as novas catedrais dos arquitetos, acompanhando a importância crescente da ação cultural para o desenvolvimento nos territórios. Não obstante as restrições orçamentais, transversais a países de parca visão global como acontece no caso português, as estratégias para a Cultura, onde se incluem os Patrimónios, os equipamentos, eventos e a formação artística multidisciplinar e multigeracional, devem ser integradas no projeto político e de desenvolvimento global e não encaradas como um complemento às demais áreas de gestão da vida pública. Neste sentido, encontrar um equilíbrio entre passado, presente e futuro, vinculado aos interesses comuns dos cidadãos, exige uma articulação cada vez mais estreita entre os setores público e privado, nomeadamente na abordagem às mudanças que as cidades, que os territórios, exigem.

O curioso, ainda, nesta notícia do El País é o alerta para o facto de a Extremadura espanhola estar, como muitas regiões em toda a Europa, em todo o mundo, cerrada sobre si própria no combate à covid-19, o que coloca nos públicos internos os protagonistas das enchentes (possíveis) a este novo espaço. O facto é revelador da imensa fome que os públicos têm de consumo cultural nos dias que correm, o que nos traz a um certo momento de constatação provocado pela covid-19 sobre o que é realmente importante e sobre o que faz a diferença nas nossas opções de tempos livres e experiências de ócio. Na triagem, e esta era uma reflexão merecida, o que nos faz falta, é muito mais a Cultura e a criação artística, nos seus grupos e temas aparentemente mais restritos, e muito menos o entretenimento e a eventualização em que víamos mergulhar os nossos territórios no período pré-pandemia.

Helga de Avelar (n.1936) nasceu na Alemanha mas em 1957 estabelece residência em Madrid onde conhece o marido, o arquiteto Jaime de Avelar. Em 1980 começa a trabalhar na galeria de Juana Mordó (1899-1984) e após a morte desta toma as rédeas do projeto. Em 1995 abre uma nova galeria, já com o seu nome, apostada em alguns nomes da cena internacional, com enfoque em práticas como a fotografia, o vídeo e a instalação. A aposta revela-se positiva e a sua galeria torna-se uma das mais relevantes de Espanha. Paralelamente a esta atividade comercial, foi constituindo a sua própria coleção que hoje tem cerca de 3000 peças de artistas espanhóis e estrangeiros e é por muitos considerada como a melhor coleção privada de arte contemporânea, em Espanha, e uma das mais destacadas e representativas em contexto europeu. A 29 de novembro de 2006 cria uma fundação com o seu nome com o objetivo de partilhar a sua coleção com a sociedade e convertê-la num projeto de referência no âmbito da difusão, produção, investigação e educação relacionadas com a criação artística visual contemporânea.

O Governo da Extremadura acabou por se interessar pela coleção e torná-la visitável em Cáceres, afirmando novas centralidades (culturais) e negando a insistência numa relação dual entre centros e periferias, totalmente desenquadrada da pluralidade que a globalização permite. Trata-se de mudar a cidade, valorizando os seus valores adquiridos mas abrindo-a ao novo, ao vindouro, dando-lhe a possibilidade de fazer parte das referências do futuro. Há alguns anos que tenho desenvolvido largo interesse sobre estes processos de transformação do espaço público, através do investimento em arte contemporânea, que podem adquirir diversas formas, sendo desejável que se somem e multipliquem, questionando verdadeiramente a ideia de espaço público, de obra de arte e de equipamento cultural, e compreendendo o potencial dos processos de democratização do acesso à Arte e à Cultura como os únicos capazes de construir comunidades sustentáveis a todos os níveis, civicamente participativas e com cidadãos impelidos a mudar o mundo e a torná-lo num lugar melhor para viver. “Mudar a cidade é mudar a vida”, escreveu Jérôme Bindé (n.1951), diretor da Organização de Análise e Previsão da UNESCO, vamos, por isso, seguir o exemplo de Cáceres e de tantos outros lugares e mudar a nossa vida, começando por mudar, com Arte e Cultura, os nossos territórios?

-Sobre Helena Mendes Pereira-

Helena Mendes Pereira (n.1985) é curadora e investigadora em práticas artísticas e culturais contemporâneas. Amiúde, aventura-se pela dramaturgia e colabora, como produtora, em projetos ligados à música e ao teatro, onde tem muitas das suas raízes profissionais. É licenciada em História da Arte (FLUP); frequentou a especialização em Museologia (FLUP), a pós-graduação em Gestão das Artes (UCP); é mestre em Comunicação, Arte e Cultura (ICS-UMinho) e Doutora em Ciências da Comunicação (ICS-UMinho), com uma tese sobre a Curadoria enquanto processo de comunicação da Arte Contemporânea. Atualmente, é diretora geral e curadora da zet gallery (Braga) e integra a equipa da Fundação Bienal de Arte de Cerveira como curadora, tendo sido com esta entidade que iniciou o seu percurso profissional no verão de 2007. No âmbito da educação e mediação cultural orienta, regularmente, visitas a exposições e museus de Arte Contemporânea, tendo já lecionado o tema em várias instituições de ensino. Integra, desde o ano letivo de 2018/2019 o corpo docente da Universidade do Minho Leciona, desde setembro de 2018, na Universidade do Minho, nomeadamente no Instituto de Línguas e Ciências Humanas (Mestrado em Tradução e Comunicação Multilingue) e na Escola de Arquitetura (Licenciatura em Artes Visuais), como Professora Convidada. É formadora sénior e consultora nas áreas da gestão e programação cultural. Publica regularmente em jornais e revistas da especialidade, tais como o quinzenário As Artes entre as Letras, nas revistas RUA e MINHA. Com mais de 13 anos de experiência profissional é autora de mais de 80 projetos de curadoria, tendo já trabalhado com mais de 200 artistas, nacionais e internacionais, onde se incluem nomes como Paula Rego (n.1935), Cruzeiro Seixas (n.1920), José Rodrigues (1936-2016), Jaime Isidoro (1924-2009), Pedro Tudela (n.1962), Miguel d’Alte (1954-2007), Silvestre Pestana (n.1949), Jaime Silva (n.1947), Vhils (n.1987), Joana Vasconcelos (n.1971), Helena Almeida (1934-2018), João Louro (n.1963), entre tantos outros. Tem larga experiência em estudos de coleções, produzido e publicado extenso trabalho crítico sobre arte e artistas contemporâneos, onde se incluem catálogos e outros resultados de investigações mais profundas sobre artistas e contextos de curadoria. É membro fundador da Astronauta, associação cultural com sede e Guimarães. Tem publicados dois livros de prosa poética: “Pequenos Delitos do Coração” e “apenas literatura e não outra coisa qualquer”.

Texto de Helena Mendes Pereira
Fotografia de Lauren Maganete

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