Diana Andringa reconhece que os jornalistas adotam uma “atitude estranha” face ao poder político, algo que não acontece em relação ao poder económico. O facto de o jornalismo se ter tornado “francamente partidário” agudizou a luta e a descrença na classe política, numa época em que o Ensino Superior passou a ser mais democrático. “Descrevem os políticos como se fossem uns malandros, uns vigaristas, uns corruptos de quem devemos desconfiar. Isto é o início do fascismo”, explica como, de uma forma não deliberada, o jornalismo pode influenciar a perceção que os cidadãos têm sobre a democracia.
A documentarista debruçou-se sobre as diferenças entre gerações de jornalistas e aspirantes à profissão: “Não se é jornalista sem viver perigosamente. Os camaradas que andam a cobrir guerras vivem perigosamente, mas penso que as pessoas não foram preparadas para isso nas universidades”. Adverte os jovens para a importância da contextualização, do sentido crítico e de ouvir os outros. “Têm de aprender a duvidar. Se chegam cheios de fórmulas, sejam elas matemáticas sejam elas de comunicação, deixam de pensar”, afirma.
O erro jornalístico, diretamente relacionado com o imediatismo, a precariedade e a degradação das condições de trabalho, precisa de ser admitido e “corrigido excessivamente”, de acordo com a jornalista. Recorda ainda o tempo em que trabalhou na RTP sob a direção do jornalista Carlos Cruz, que se empenhava particularmente na verificação dos factos e no debate entre profissionais do setor: “Não saía da redação antes do telejornal acabar. Ficávamos todos a ver o telejornal e, no final, havia um debate sobre aquilo que estava certo, aquilo que estava errado e sobre aquilo que podíamos ter feito melhor”.
Quase 20 anos volvidos, Diana Andringa reflete sobre as reações ao documentário Era uma Vez um Arrastão, que tenta desmontar os incidentes ocorridos na praia de Carcavelos, no dia 10 de junho de 2005: “Há uma parte da classe [jornalística] que ficou muito zangada comigo porque achou que não se devia denunciar aquilo. O racismo existe, a xenofobia existe, a desconfiança do que é diferente existe.” Na sua opinião, os órgão de comunicação social têm contribuído para o exacerbar de narrativas sobre determinados lugares, mas “é preciso estar extremamente atenta para não cair na lógica do medo, porque o medo é uma lógica que tem muito peso”.
“Constitucionalmente não deveriam existir partidos que fazem propaganda xenófoba e racista. Se me mentem, tenho o dever, não apenas o direito, de dizer: ‘desculpe, parece-me que aquilo que está a dizer não corresponde à realidade’. Acho que é mais importante contraditar e desfazer um discurso que é falso do que simplesmente tentar impedi-lo”, afirma ainda a jornalista, sobre o espaço mediático que deve ser dado a forças políticas que alimentam o discurso de ódio, xenófobo ou racista. Diana Andringa acredita que o fascismo se perpetua sobretudo nas relações hierárquicas, uma vez que existe uma dificuldade em contestar as opiniões dos outros e reivindicar atos de humilhação.
Já sobre a Guerra Colonial, reflete acerca do silenciamento que assombrava o tema, ainda na década de 1980, quando estreou a série documental Geração de 60. “Eu não consegui encontrar um entrevistado que me dissesse que tinha morto uma pessoa. Ainda por cima tinha morto do lado errado da guerra. É terrível confessar isto”, partilha. “Eu era capaz de perceber isso, mas era preciso que as pessoas também fossem capazes de o dizer. Hoje em dia já são, felizmente.”
Para a jornalista, há ainda feridas abertas do período colonial e do Estado Novo. “Há pessoas em Portugal com quem nunca tivemos nenhum cuidado”, diz, referindo-se aos chamados “retornados” e também aos presos políticos durante a ditadura. “As pessoas começam, outra vez, a lembrar-se e a viver o tempo em que estiveram presas, o tempo em que foram torturadas. Passou o tempo, mas não esqueceram. Essas coisas não se esquecem, não se esquecem de uma geração para outra”.
Diana Andringa considera ainda fundamental integrar os processos de resistência e os movimentos de libertação colonial nos currículos escolares em Portugal. Segundo diz, “provavelmente [isso] resolvia uma parte das questões de xenofobia e de racismo existentes aqui.”
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