A nova criação de Daniel Matos, #LIMOEIRO 55, estreia no palco da Rua das Gaivotas 6, em Lisboa, entre os dias 23 e 25 de junho. Inspirada na coleção fotográfica “Dash Show: I love You, Stupid”, de Gleen O’Brien, a peça, com produção da CAMA associação cultural, reflete sobre o imediato dos corpos e da vida, voltada para a urgência do entendimento de nós próprios.
Em conversa com o Gerador, o artista Daniel Matos revela-nos com profundidade a génese do #LIMOEIRO55, uma performance que propõe ao espetador focar-se “em como é que o imediato serve como desaceleração à velocidade que trazemos do exterior e que nos cega ao essencial”, na constante busca de nós próprios. “Eu procuro perceber melhor as pessoas, incluindo-me a mim,” confessa Daniel, “perceber melhor porque é que sentimos tanto e tão pouco em simultâneo, estudar este escudo que é o corpo e que carregamos todos os dias com pouco pensamento sobre as suas potencialidades, desilusões e feridas a fundo.” A fuga do entendimento do “eu” e do “outro” foi um dos propósitos para a criação deste espetáculo, que assume uma perspetiva de procurar o reencontro, o essencial do corpo e da vivência coletiva.
#LIMOEIRO 55 é composto por dois corpos, dos performers e co-criadores Hugo Cabral Mendes e Lia Vohlgemuth, que interpretam os seus corpos como “veículos do vazio, túneis por onde passam comboios a alta velocidade”, explica o criador, Daniel Matos. “Ao mesmo tempo são um só, porque se unem na incansável procura do que é construir-se como estrutura de sustento de si e do outro, mas sempre com a consciência de que as Torres Gémeas só desabaram porque se obrigaram a ser um par, de mãos dadas sem se tocarem uma à outra.” A performance caracteriza-se, assim, por uma sucessão de tarefas às quais os corpos respondem em conjunto e sozinhos, criando fricção e aludindo a uma solidão frágil e emotiva, que nos impele a “perspetivar o lugar do TUDO no agora”, acrescenta Daniel, “onde ambos partem da estaca zero para o objetivo final, que é fazer-se cumprir a si, à sua presença e ao seu abandono. “
Neste universo captado em #LIMOEIRO55, o confronto com a realidade dos corpos é assumido como uma reflexão necessária, entendendo que, para lá do corpo, é possível ver mais daquilo que somos, como explica o artista, “dão-nos o corpo para nos podermos ver a nós do outro lado, e estes dois corpos são um e milhares, em sequência e por consequência.”
A inspiração na obra fotográfica “Dash Snow: I love You, Stupid”, do Glenn O'Brien, reside na ausência de preparação para o momento. Esse imediatismo, que acaba a congelar o agora dos corpos e dos momentos, serviu de mote à conceção do #LIMOEIRO55. “O vazio da peça nasce também daí, da inexistência da composição obrigatória, da inexistência do cuidado extremo. Aquelas fotografias aproveitam muito mais o presente do que nós que estamos vivos e que o deixamos passar ao nosso lado”, afirma Daniel.
À Rua das Gaivotas, em Lisboa, chega o mais recente trabalho de Daniel Matos, depois da criação "Num Vale do Aqui", motivo de entrevista com o Gerador, em 2019. “Trabalhar com uma proximidade diferente com o público, num ambiente muito mais intimista e encontrar esta relação dentro de um dueto são focos de trabalho muito concretos, o que potenciou a velocidade do trabalho e a maneira de olhar para o objeto e perceber aquilo que ele pede”, diz Daniel Matos, “#LIMOEIRO55 foi também uma maneira nova de olhar para a estruturação esqueleto de um objeto coreográfico, através de um método sucessivo de proposta de tarefas concretas mas ao mesmo tempo bastante abertas para os performers, onde se cria um link entre corpo de peça e necessidade individual de construção dos performers”.
“A peça só acontece se a deixarmos respirar connosco, no mesmo patamar. É a obra que manda e que nunca está acabada”, finaliza Daniel, a propósito das expetativas para a estreia absoluta. #LIMOEIRO55 ocupa o espaço da Rua das Gaivotas, em Lisboa, nos próximos dias 23, 24 e 25 de junho, pelas 19h, e ainda no Centro Cultural de Lagos, a 20 e 21 de agosto, onde será possível visitar a imensidão de dois corpos que convidam a olhar o interior, o presente e o encontro com a intensidade da arte coreográfica.
Texto de Ana Mendes
Fotografias de Alice Aires
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