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Texto de Leitor

Carta do Leitor: De quanto e qual amor ainda carecemos?

A Carta do Leitor de hoje chega-nos pelas mãos de Leonardo Camargo Ferreira, que inspirado no filme Verão de 85, fala-nos nas múltiplas formas de amor.”Verão de 85 apresenta-se extremamente atual pela complexidade ou mesmo pelo paradoxo que nos revela quanto à afetividade humana. Se pensarmos na quantidade de formas que existem para desenvolvermos o que de bom há em nós, o amor, pensaríamos facilmente estarmos na melhor das alturas da nossa existência para permitir que ele florescesse.”

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Hoje apeteceu-me escrever sobre o amor. O amor que temos e que não temos, que desejamos quando estamos terrivelmente sós e que descartamos nos momentos em que o reconhecemos como garantido. O amor possuído por outra pessoa, na sua versão mais romântica ou em qualquer outra forma que represente um laço de força, de companheirismo, mas nunca continuamente estável, antes atravessando picos e despiques por fazer fluir tão intensas emoções.

Verão de 85 (2020), que assisti nestes dias, foi o filme que me levou a pensar nas cumplicidades que partilhamos. E trago esta palavra, “cumplicidade”, com dois sentidos: o carinhoso e o criminal. No meu 10.º ano tive uma Professora de Filosofia que pouco apreciava o uso deste termo quando aplicado ao namoro ou ao casamento, precisamente pela alusão ao mundo dos delitos e das prisões, um mundo que, à partida, deve ser incompatível com o do afeto. Todavia, será mesmo? Afinal, esta obra cinematográfica, relatando um elo entre dois jovens masculinos apaixonados, alerta-nos para a importância de viver o amor de um modo comprometido, pois de outra maneira experiências de intimidade poderão acabar em tragédias – como a da morte de um dos protagonistas.

Este compromisso, não obstante, é um tremendo desafio na realidade do efémero. Verão de 85 também aborda esta problemática, possivelmente, a meu ver, o mais importante dos temas trabalhados pelo realizador François Ozon. O desencontro entre as cosmovisões dos dois rapazes é mais do que os ciúmes de um deles relativamente ao facto de o outro o ter traído: é o choque interpessoal e mesmo cultural entre a visão do amor envolvente, implicado, incluído, proveniente de uma amizade de confiança extrema (protagonizada por Alex), e a construção de uma juventude pautada pelo divisor máximo comum de práticas, de sensações, do chamado “viver a vida” (arquitetada por David). Perspetivas cuja conciliação, senão impossível, implica frequentemente perdas e submissões de identidades e ascensões de infelicidades, mais tarde reveladas em discussões pesadas.

Ainda assim, haverá flancos para a esperança poder entrar? O filme transmite-nos essa ideia de possibilidade. No início da relação, Alex e David comprometem-se a dançar na campa daquele que falecer mais cedo, uma tarefa hercúlea para o primeiro após o desaparecimento corpóreo do segundo. No entanto, a profundidade do romance que viveram proporcionou a efetivação desta promessa, permitindo acreditar que existem valores pessoais superiores ao da liquidez artificial dos tempos e dos sentimentos, como tão bem nos diria Zygmunt Bauman.

Verão de 85 apresenta-se extremamente atual pela complexidade ou mesmo pelo paradoxo que nos revela quanto à afetividade humana. Se pensarmos na quantidade de formas que existem para desenvolvermos o que de bom há em nós, o amor, pensaríamos facilmente estarmos na melhor das alturas da nossa existência para permitir que ele florescesse. O planeta sempre viveu com desigualdades profundas, mas hoje existe um maior respeito pelas pessoas na sua plenitude, independentemente se estas amam ou são amadas por indivíduos de sexos diferentes ou do mesmo sexo, de cores distintas ou da mesma cor, de idades pouco ou muito semelhantes. A excitação, o prazer, as relações sexuais, por vários lugares, já não são um tabu. Em termos tecnológicos, temos ao dispor formas acessíveis para dialogarmos e estabelecermos encontros de amizade ou romanescos. Ainda assim, presenciamos nada menos que uma lacuna de vínculo, do duradouro, na crença em projetos relacionais com sentido e com franqueza.

Retorno às múltiplas formas de amor do início do meu texto. Perante tanta diversidade, porquê tanto isolacionismo? No que estamos a falhar? (Uma pergunta tantas vezes formulada que chega a ser um lugar-comum.) Ou podemos perguntar: do que já conseguimos, o que nos falta para alcançarmos uma consciência coletiva, como Durkheim propunha através do seu estruturalismo, unida de uma ação individual constitutiva da sociedade, na conceção compreensiva de Weber, em prol da afetividade?

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Texto de Leonardo Camargo Ferreira

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