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Arte Urbana: as ruas estiveram vazias, mas não foi um momento de silêncio

Um pouco por todo o mundo, a situação de pandemia que se vive  fez despontar…

Texto de Redação

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Um pouco por todo o mundo, a situação de pandemia que se vive  fez despontar obras de arte urbana em inúmeros espaços públicos que refletem a atual conjuntura social. Nessas mesmas paredes podem vislumbrar-se hoje figuras humanas de máscara, analogias pictóricas com a forma do novo coronavírus ou até mesmo frases que tão bem caracterizam os novos comportamentos a ter face às múltiplas condicionantes de mobilidade. À semelhança do que se vê noutros países, sabemos que por cá, pelo menos, o artista João Maria Ferreira tem pintado murais em diversos espaços urbanos, num modelo a que chama de diário gráfico de dias isolados, e que vai partilhando através da sua página de Instagram. 

Se é verdade que esta situação obrigou a uma quase total suspensão da atividade cultural, também o é que fez emergir novas ideias em torno da importância da arte e daqueles que a criam. A partir de casa ou até mesmo na rua, de forma mais ou menos planeada, a arte urbana – que antes já estava bastante alavancada na própria regeneração dos espaços – parece ganhar uma importância significativa neste momento. Por um período de tempo, as ruas estiveram vazias, mas esse mesmo confinamento não se verificou na criação artística.

Em Portugal, ao longo dos últimos anos, foram surgindo projetos, iniciativas e uma lista imensa de artistas que tomaram as ruas de assalto para as tornarem em verdadeiras telas de criação contínua. Das primeiras peças em graffiti, rapidamente esse paradigma mudou para um contexto pictórico e escultórico mais abrangente. Tal fenómeno parece ter dado azo a um movimento de artistas que não queriam esperar pela oportunidade de expor o seu trabalho em museus e galerias, sendo que outros nem sequer estavam interessados nessa mesma convenção.

Como já referimos no Gerador, a atual crise pandémica colocou a descoberto diversas fragilidades no setor da cultura, que colocam dúvidas sobre a sustentabilidade dos próximos meses de trabalho, ainda marcados pela incerteza. Mesmo com a reabertura gradual de museus, galerias e outros espaços de exposições, as diversas condicionantes de segurança poderão não ser atrativas para uma visita aos mesmos. Uma vez mais, a rua parece tornar-se num elemento essencial, em que a arte – sob a alçada de um sentido de missão pública – pode ser uma forma de confrontar as necessidades de fruição artística. 

Partindo destes pontos de reflexão, as vozes aqui reunidas transmitem a ideia de uma suspensão – mais do que uma simples paragem –, que pode potenciar novas formas de arte pública. Além disso, e muito embora pese a questão dos apoios, reside a certeza de que no seu rescaldo, a atual conjuntura pode ter um impacto significativo na forma como se irá projetar e repensar a intervenção artística no espaço público, igualmente em mutação.

Sair à rua: uma opção ou uma impossibilidade?

As dificuldades que se fazem sentir neste período de isolamento, que são transversais às diferentes áreas culturais, em Portugal mas também no mundo, têm sido o tema primordial das reportagens que temos partilhado aos sábados. Também no domínio das artes visuais, e em particular da arte urbana, de uma forma geral, os artistas viram-se confinados, resultando na perda de trabalhos que tinham alinhados para estes meses, o que implica uma quebra de remuneração. 

Se imaginarmos a tradicional narrativa que pinta o artista urbano como aquele que se move na sombra, de rosto desconhecido e passo veloz, permitindo-lhe colorir as paredes de edifícios sem que seja identificado, este período de confinamento poderia facilmente ser visto como favorável à saída para as ruas, agora mais despidas de olhares vigilantes e, portanto, mais receptivas a este tipo de atividade. 

Essa foi uma prática que se verificou um pouco por todo o mundo, tal como revela o artigo “Street Art Confronts the Pandemic”, publicado no New York Times no passado dia 1 de maio. Tal como podemos ler, da Noruega ao estado norte-americano do Colorado, são vários os artistas que se debruçaram sobre a temática da covid-19 para, com mais ou menos humor, fazer transparecer este período que atravessamos nas suas obras. Em Portugal, temos um exemplo no artista supracitado. Por outro lado, fomos falar com os artistas urbanos Miguel Januário (MaisMenos), Tamara Alves e Mário Belém e todos nos disseram que, durante este período, não saíram às ruas para pintar murais. 

Tamara adianta que, embora perceba a oportunidade que constitui as ruas estarem vazias, não fez nenhuma intervenção em espaço público, por achar que, de uma forma geral, os artistas perceberam que se perdeu algo “que nos era dado como garantido”. “Tornou-se importante para mim reflectir, mais do que agir de imediato.” Também Januário aponta uma questão que se liga ao “respeito pelas pessoas”. “Estava toda a gente a confinar-se e não sei se era justo ir intervir nesta altura. Estar a tirar proveito disso. Por isso, também não me senti tão à vontade para o fazer.” Por outro lado, conta-nos que foi pai em fevereiro deste ano, factor que também pesou na sua decisão, aproveitando o tempo em que decidiu ficar em casa para “refletir sobre trabalho, sobre o futuro, o contexto e tudo o que vem aí”.

Mais do que uma impossibilidade, a decisão de sair às ruas para as pintar, ou não, trata-se disso mesmo – uma opção. No entanto, tal não significa que a criação tenha entrado em suspensão. “Acho que é uma opção de cada um poder ir fazer trabalhos e aproveitar o momento. Acho que é importante também, porque, apesar de tudo, não é um momento para estar silencioso”, avança Januário. 

Para o propósito da presente reportagem, de entre os apoios anunciados por parte do Governo para apoiar o setor cultural, podemos destacar o “apoio a todos aqueles que viram a sua atividade cancelada, que consiste numa prestação de apoio social e no adiamento das contribuições para a Segurança Social”, como dizia Graça Fonseca, ministra da cultura, em declarações à Lusa, e o apoio dirigido aos trabalhadores independentes, que trabalhem exclusivamente a recibos verdes, que se concretiza num apoio mensal que pode ir até aos 438 euros. Se os três entrevistados estavam em concordância na decisão de não sair às ruas para pintar durante este período, também o estão no sentimento face às medidas que têm vindo a ser criadas pelo Governo: não se sentem apoiados. 

Mário Belém conta que se candidatou ao apoio anunciado para os trabalhadores independentes e, até à data, ainda não obteve qualquer resposta. Já Januário partilha que recorreu ao apoio relativo às contribuições para a Segurança social, porque perdeu alguns trabalhos que iria realizar nos meses de abril e maio, não tendo, igualmente, obtido resposta até hoje. “Hoje já é 14 de maio (data em que foi feita a entrevista pelo Gerador) e já pedi isto há um mês, pelo menos, e não tive resposta. Se estivesse mesmo a precisar, estava complicado. E arrisco-me a não ter nenhum apoio, ou a ter um apoio mísero como muita gente que anda a receber aos 90 e 150 euros de apoio”, colmata. Tamara resume esta perceção num sentimento de insuficiência: “Da parte do Governo, sinto que as medidas são insuficientes. Sempre o foram.”

A reinvenção dos espaços que dão lugar à arte urbana 

Atualmente, são muitos os espaços e entidades cujo o trabalho está, em grande medida, relacionado com a arte urbana e com a necessidade de dar mais destaque a estes artistas que começam, muitas das vezes, a criar nas ruas. 

Em Lisboa, a galeria Underdogs tem alicerçado o seu trabalho na promoção de artistas que deambulam pelo universo híbrido que vai da arte urbana até à criação contemporânea, com especial enfoque em programas de arte pública. A atual conjuntura obrigou ao encerramento das suas portas, mas nem por isso o trabalho deixou de ser feito. Pauline Foessel, fundadora e codiretora da Underdogs, conta ao Gerador que, em virtude do estado de emergência primeiramente imposto, houve a necessidade de se fazer um “brainstorming de ideias” para se perceber como podiam continuar a “ajudar os artistas e a vender peças da galeria”.

Dessa mesma reflexão surge então a ideia de “fazer uma exposição de grupo online, em que os artistas pudessem criar peças que refletissem sobre este momento de isolamento e de quarentena”. “Por isso, lançámos o desafio de poderem fazer essas peças recorrendo a materiais que se encontram em casa e que não são os materiais que esperamos normalmente destes artistas”, acrescenta.

A exposição, a que chamaram “Right Now”, abriu esta sexta-feira, dia 15 de maio, reunindo 32 participações, que vão de MaisMenos a Bráulio Amado, de Maria Imaginário a Francisco Vidal, passando ainda por Wasted Rita, Tamara Alves ou Mário Belém. Num comunicado de apresentação, a Underdogs reforçava a importância de “juntar pessoas” e refere que hoje, mais do que nunca, “é crucial manter o sentido de comunidade para garantir apoio e conforto durante este novo capítulo na nossa experiência humana partilhada”. Esta exposição, referem ainda, “consiste numa reflexão do tempo presente vista pelos diversos, criativos olhos dos artistas”. 

Por seu lado, Hugo Cardoso, responsável pela Galeria de Arte Urbana (GAU) do Departamento de Património Cultural da Câmara Municipal de Lisboa, que tem como principal missão a promoção do graffiti e da arte urbana na cidade de Lisboa, salienta ao Gerador que, mesmo com a atual situação, serão mantidos os diversos compromissos feitos com os artistas.

“Tivemos de colocar praticamente todos os projectos no terreno em stand by, mas todos os outros que iam avançar foram recalendarizados”, garante, acrescentando que já esta semana foi retomado um mural do artista Smile1art relativo à iniciativa Lisboa Capital Verde Europeia 2020.

Smile1art trabalho no mural da iniciativa Lisboa Capital Verde Europeia 2020© CML | DMC | Bruno Cunha

A par disso, a GAU lançou a iniciativa #diariosdeArteUrbana com o objetivo de partilhar aquilo que alguns artistas estão a desenvolver durante este período de quarentena. “Pedimos aos artistas para nos mostrarem o que estão a fazer e a pensar numa altura em que não estão na rua e, estando em casa, como é que mantêm ativa a produção artística. Muitos deles reagiram com projetos que desenvolveram e pensaram com estruturas alternativas de produção”, sublinha.

Tendo em conta o impacto da atual situação no panorama cultural, Hugo Cardoso acredita que no seu rescaldo a intervenção artística pode “ter um papel fundamental na retoma” do espaço público. “Se estamos condicionados na visita aos espaços fechados, vamos passar mais tempo na rua e aí pode haver um maior relacionamento com o espaço público. Acredito que vamos olhar para locais para onde antes não olhávamos. Essa é a nossa responsabilidade, percebermos de que forma é que podemos gerar arte urbana e pública que permita às pessoas no seu dia a dia poder usufruir desta tipologia de arte”, sustenta.

Por seu lado, também Pauline Foessel refletiu acerca do papel da arte pública, de forma a apontar caminhos possíveis de ação, nesta altura. “Penso que é essencial para apoiar os artistas e para trazer arte às pessoas que estão mais isoladas. Para mim, o papel da arte pública é sempre fundamental, porque traz arte à comunidade e às pessoas que nem sempre têm oportunidade de irem aos museus e às galerias.”

Recorde-se que a GAU é também responsável pela organização do festival Muro, que pelo seu carácter bianual só terá lugar em 2021, e através do qual se têm desenvolvido diversas intervenções artísticas em diferentes bairros periféricos da cidade de Lisboa com o objetivo de descentralizar a oferta cultural e artística.

Dos murais sem público ao desafio de se tomar a casa como tela

O trabalho em casa sempre fez parte das rotinas dos artistas urbanos, principalmente numa primeira fase de pesquisa, conceptualização e preparação das pinturas que viriam a ganhar forma num mural. Mário revela que, mesmo quando cria um mural, as “primeiras etapas são sempre digitais”. “Faço o esboço à mão e trabalho-o em Photoshop”. 

Para Tamara, que encontra na literatura e poesia duas das suas principais fontes de inspiração, começa por tentar perceber “o contexto do mural” que vai realizar, estudando o assunto e tentando perceber o “conceito e a mensagem” que quer transmitir. Numa fase posterior, tira fotografias e desenha e, só no final deste estudo, começa a pintar. Por sua vez, Januário associa o “estar em casa” a uma fase de trabalho que compreende o “pensamento, preparação e conceptualização”, recorrendo a pesquisas que possam “estimular alguma ideia em particular”. 

Porém, por muito que existisse, à partida, um trabalho de índole caseira, este cenário atípico que invadiu as nossas vidas demarca-se de qualquer contexto usual do trabalho dos artistas, podendo interferir, inclusive, na própria disponibilidade emocional e intelectual para criar. 

Januário personifica este tempo como uma “montanha russa emocional”. “Existe esse lado mais produtivo e criativo, mas também tive aqui dias em que senti que as ideias não tinham sentido, ou que não conseguia pensar em nada, porque me senti preso e amarrado por isto, por esta incógnita toda.” Acima de tudo, o artista identifica este período como sendo de reflexão e duma coisa não lhe restam dúvidas - “matéria para trabalhar não vai faltar, porque vamos entrar num mundo mais bizarro com consequências sociais, políticas, económicas e isso pode trazer bastante pano para coser.” De entre todas as ideias, partilha que tem andado a pensar na “relação entre o real e o virtual, sobre a questão da vigilância e deste policiamento e um pouco sobre a transformação que vai existir – uma sociedade um pouco mais selvagem versus a esperança de uma sociedade mais cooperativa.”

Mário partilha este sentimento. “Tenho passado por dias seguidos em que não faço absolutamente nada, e tenho tido semanas pontuais em que não paro quieto.” Para Tamara, foi importante deixar que a criatividade chegasse de forma natural, apesar de todas as limitações. Uma vez chegada a criatividade, “aproveitei para experimentar materiais, cometer erros, pintar elementos que não pintaria se não tivesse tempo, etc.”

No dia 15 de abril vimos, impresso no feed de Instagram de Banksy, imagens da sua casa de banho, alvo de uma intervenção artística sua, como reflexo do confinamento. Na legenda da imagem, era possível ler que a sua mulher odeia quando ele trabalha a partir de casa. 

https://www.instagram.com/p/B_Aqdh4Jd5x/?igshid=1a3h163wffa4x

Dias mais tarde, na madrugada do dia 25 de Abril, no “Como é que o Bicho Mexe?”, o direto de Instagram de Bruno Nogueira que muitos acompanhou durante este período de confinamento, Alexandre Farto aka Vhils terminava uma das suas obras, que marcou a diferença por ser gravada numa das paredes da sua sala de estar, em que retratava o músico português Zeca Afonso. 

https://www.instagram.com/p/B_aM_IkDY6C/?igshid=gjgvsbtv9g9y

De repente, vemos despertar um olhar atento para o seio do lar como potencial objeto de criação. Porém, esta altura não foi necessariamente a primeira em que os artistas usaram as paredes de sua casa como tela. Tamara revela que não é a primeira vez que o faz em sua casa. “Acaba por ser tão fácil pintar na parede como, logo em seguida, pintá-la de branco novamente.”

Neste sentido, Januário destaca o desafio que lhe foi lançado pela Underdogs que o levou a olhar para a sua casa de maneira diferente. “A peça que tenho na Underdogs não é nenhuma parede, mas é uma persiana do senhorio. Foi pintada na persiana, portanto, como é uma exposição com uma vertente comercial, e caso a peça seja vendida, vou ter de tirar a persiana e substituí-la. Andava a ver tudo o que poderia fazer com as coisas cá de casa. Para já, foi isso. Depois, utilizei outras coisas que tinha ou peças que já tinha feito, visto que as lojas estavam fechadas e não dava para fazer grandes compras de materiais.”

Peça criada por MaisMenos para a exposição online “Right Now” da Underdogs ©Fotografia disponível no site da Underdogs

Mário confessa que em sua casa não “há espaço nenhum para pintar”, porque as suas paredes já estão “cobertas com obras de outros artistas”. E não será essa uma tendência que, cada vez mais, se dilata? 

Das mãos dos artistas para as nossas casas 

O trabalho de um artista urbano não se limita ao ambiente da rua. Hoje, quase todos os artistas vendem prints, stencils, serigrafias, ou outros formatos por via online. Mário explica que lhe dá “bastante gozo” não se cingir “a uma única área de criação artística”. “Hoje em dia, divido o meu tempo entre fazer peças artísticas e trabalhos comerciais. São dois tipos de desafio e sinto-me muito realizado com ambos”, continua. 

A existência dessa dimensão comercial prende-se, por um lado, com uma necessidade económica, e, por outro, pela possibilidade de apostar numa democratização da arte, algo que é visível pela presença das obras destes artistas em cada vez mais casas de admiradores. “Também se tornou numa arte acessível. As peças de arte, normalmente, são caras para o bolso comum, por isso, essa é uma forma de as pessoas terem os artistas dentro de casa, terem algum acesso a peças mais acessíveis dos artistas. Vemos na forma como as pessoas aderem àqueles give aways no Instagram e vês que tem uma procura imensa. Mesmo nas lojas online, as coisas desaparecem e esgotam. Portanto, sim, acho que é uma forma de teres os artistas que admiras na tua casa”, explica Januário. 

Acima de tudo, o artista conhecido por MaisMenos considera que é essa transversalidade que caracteriza o artista contemporâneo. “Grande parte dos artistas que praticam no espaço público acabam por ter outras linguagens próprias, com outro tipo de aplicações e suportes. Neste momento, o trabalho é muito transversal. Acho que hoje em dia já faz mesmo parte, aliás é quase uma espécie de receita a malta da street art fazer um mural com uma linguagem específica, umas peças com outra linguagem para a galeria e depois faz umas serigrafias e uns prints com essa mesma linguagem para ter uns valores mais acessíveis.” 

Tamara completa este raciocínio refletindo sobre o trabalho online dos artistas urbanos. “A rua é um meio de intervenção para um artista urbano, mas nunca é só na rua que um artista se consegue expressar.  Desde há muito tempo que o online é uma grande parte da divulgação do trabalho de um artista, mesmo que a sua zona de intervenção seja maioritariamente a rua. Desta forma, o trabalho viaja de casa em casa e, mesmo que deixe de existir fisicamente, existe de forma digital. A partir do momento em que há um registo este torna-se imortal”, realça.

Numa altura em que se viu reduzido o espaço público, amplificaram-se os olhares do público para o trabalho online. Um exemplo desta migração é a já referida exposição exclusivamente online da Underdogs, que não só deixou o seu site ser preenchido por obras criadas no seio do isolamento e com recurso apenas ao que os artistas encontravam em suas casas, como possibilita a compra das obras criadas alargando a possibilidade de mais pessoas ilustrarem as suas paredes com as tais obras dos artistas que admiram. Tamara, uma das artistas desafiadas pela Underdogs, salienta ainda que esta iniciativa permitiu aos artistas “repensar uma nova forma de intervenção urbana, ainda mais efémera e bastante emotiva tendo em conta o que estamos a passar.” Olhando para o momento de criação que atravessamos, Pauline complementa a observação de Tamara ao dizer que acredita “que este será um momento de oportunidade no que diz respeito à criação artística.”

Um princípio para novos caminhos

Ainda no início da situação de pandemia na Europa, Hans-Ulrich Obrist, diretor artístico das Serpentine Galleries, situadas em Londres, lançava o repto de se criar um projeto de arte pública que dê espaço às novas gerações de artistas e que promova o acesso à arte por parte de comunidades que nem sempre têm essa possibilidade de fruição. Ainda que ambiciosa, a proposta deste galerista é, de alguma forma, partilhada por diversos artistas que veem neste período a possibilidade de se abrirem novos caminhos no que diz respeito à fruição e criação artística.

Já esta semana, na passada quarta-feira, o Gerador dinamizou uma conversa com especial enfoque nalgumas destas questões, que contou com a participação dos artistas Bordalo II e Vanessa Teodoro, e ainda da responsável pela galeria Underdogs, Pauline Foessel.

Conversa Central “Os novos desafios da arte urbana com Bordalo II, Pauline Foessel e Vanessa Teodoro” do Gerador, realizada no dia 13 de maio de 2020

Um exemplo disso é visível no caso português, em que, ao longo dos últimos tempos, o Gerador foi dando conta de vários movimentos que evidenciam uma grande união daqueles que representam o meio cultural. Recentemente, o feed quer do Facebook, quer do Instagram, preencheu-se de posts em branco, associados a um manifesto intitulado “Unidos pelo Presente e Futuro da Cultura em Portugal”. O movimento tem juntado artistas dos diversos quadrantes e trabalhadores da cultura que pedem por mais apoios e uma maior proteção laboral face a situações de que já demos conta ao longo deste texto.

Perante um setor muitas vezes disperso pelas múltiplas vozes que o compõem, Miguel Januário acredita que este “tipo de resistência é uma resposta interessante”, sinal de que as pessoas se estão “a unir e a pensar em conjunto”. Algumas das ações pensadas por estes movimentos apontam, a título de exemplo, para pequenas manifestações que, dentro das medidas de segurança, serão feitas na rua, em espaços de importância política - o que não deixa de ter um paralelismo interessante com aquilo que é o mote originário da própria arte urbana.

Em poucos meses, é provável que, tal como noutros países do mundo, a arte urbana produzida em Portugal reflicta o momento pelo qual estamos a passar, mas, mais do que isso, sublinha-se a ideia de que as diferentes manifestações artísticas que forem colocadas em prática terão como objetivo repensar a importância da cultura no país. Essa mesma reflexão começa nas ruas e, certamente passará pelos murais destes artistas.

Texto de Andreia Monteiro e Ricardo Ramos Gonçalves
Fotografia de Patrick Tomasso, disponível via Unsplash

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