A poucos dias das eleições legislativas comparam-se propostas e assiste-se aos 25 minutos inflamados dos debates eleitorais. Viva a democracia! A educação, apesar de constar no programa de todos os partidos, é um assunto cujo foco se centra apenas na discussão “escola pública VS escola privada” e na legitimidade do carácter obrigatório de certas disciplinas. E isto diz muito sobre como é vista a educação em Portugal…
“Educação não transforma o mundo. Educação muda as pessoas. Pessoas transformam o mundo”. Paulo Freire foi um educador brasileiro que deixou marcas profundas na história da pedagogia e é o autor desta premissa que encerra a importância da educação enquanto pilar fundamental da sociedade, pelo seu poder transformador. O contexto finlandês é facilmente relacionável com esta ideia. De facto, a educação teve e continua a ter um papel preponderante na construção das bases sólidas do país e é vista como polo de prosperidade. Não são, por isso, inesperadas as palavras da ex-Ministra da Educação finlandesa, Sanni Grahn-Laasonen, quando, em entrevista ao Diário de Notícias, em 2018, afirmou que “muitos dos nossos jovens talentosos querem ser professores. É uma profissão respeitada”.
Por cá o cenário é bem diferente. São cada vez menos os jovens a optar pela carreira de professor. Segundo os dados do relatório do Conselho Nacional de Educação – CNE – referente ao estado da educação em 2019, no que diz respeito ao curso de Educação Básica “após a subida registada entre 2008/2009 e 2011/2012, (…) em termos de alunos inscritos, registou-se uma diminuição de cerca de 50% entre 2011/2012 e 2017/2018”. Segundo o mesmo relatório, e contrariamente ao que acontece na Finlândia, em Portugal, as notas de ingresso para a frequência de cursos que habilitem para a docência são das mais baixas, sobretudo quando se analisa a evolução das classificações mínimas de ingresso, ao longo da década.
Há vários fatores que podem explicar o desinteresse dos jovens pela área da educação, mas para Rui Trindade há um que parece congregar todos eles. O investigador dizia em 2011, no artigo As políticas educativas como obstáculo à escola democraticamente organizada, que a carreira docente é “objeto de um processo inequívoco de desvalorização salarial e social”. De 2011 para cá, pouco parece ter mudado. Segundo o relatório do CNE, apenas 9,1% dos professores portugueses considera a profissão valorizada pela sociedade, percentagem muito inferior aos 58,2% registados na Finlândia.
É verdade que não se pode exigir ao sistema de ensino português aquilo que é feito no contexto Finlandês. As circunstâncias que sustentam ambos os modelos são muito diferentes. Também é verdade que a educação em Portugal assistiu a uma grande evolução desde o pós-25 de abril. No entanto, há ainda muito a fazer e o caso da Finlândia é um exemplo a não perder de vista. Até porque, se nada se fizer a respeito da representação social dos professores e da profissão, o caminho que percorremos pode afigurar-se perigoso, já que sem competitividade na área, a seleção de professores seguirá critérios de qualidade pouco exigentes. Dessa forma, o ciclo de descredibilização não será quebrado, a mudança das pessoas ficará aquém e a transformação do mundo será apenas uma miragem.