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Karetus e Romeu Bairos, é pela “Saudade” que se fazem ouvir

Chegou na noite friaEm que minh’alma sofriaEm que a saudade moravaEm que a chuva caíaNa…

Texto de Patricia Silva

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Chegou na noite fria
Em que minh’alma sofria
Em que a saudade morava
Em que a chuva caía
Na rua ninguém havia
Nenhum fadista cantava


Vira e volta a saudade
Meu amor
A distância que nos separou
A nossa a vida, a nossa a vida
Meu amor
Rasga a máscara que sufocou
A nossa a vida, a nossa a vida


Vira e volta a saudade

Vira e volta a saudade
Vira e volta a saudade
Vira e volta a saudade

                                                          “Saudade”, Romeu Bairos e Karetus, 2021


“NÃO VIRES COSTAS À CULTURA”, lia-se nas costas de Romeu Bairos na performance da Final do Festival da Canção, no dia 6 de março. Depois de “virar” e “voltar a saudade”, esta expressão chegou a todxs nas costas de Romeu. Levantando questões que refletem a Cultura, os amigos de longa data que já cruzavam o seu percurso musical através da partilha de ideias no processo de criação, caminharam até ao Festival da Canção. Não se consagraram vencedores, no entanto, a sua viagem está longe de terminar. Com o objetivo de erguer a tradição e a voz perante a Cultura, o Gerador conversou com os artistas ainda antes da final acontecer. Além dos temas já mencionados, falámos também sobre palavras tão importantes como a “saudade”, o ultrapassar barreiras e as surpresas que o mundo musical lhes deu quando menos esperaram.

Os Açores e as terras lisboetas apresentavam um legado ainda antes de chegar ao palco do festival.

Oriundo das Furnas, S. Miguel, Romeu voa até Lisboa para se dedicar àquilo que o faz viver. Com vários projetos musicais, também passou pelo The Voice Portugal, no entanto, é na rua que gosta de se fazer ouvir, onde o jazz também o acompanha.

Já os Karetus, Carlos Silva e André Reis, DJs e produtores aficionados pela música eletrónica, exploram a desconstrução instrumental, ligando vários géneros e ritmos com o objetivo de criar aquilo de que tanto gostam – música. Ligados também à performance, desde 2012, têm vindo a destacar-se no universo musical.

Com olhares comuns, ainda que de registos diferentes, a ‘alma’ dos artistas levou-os até à Saudade, um tema que une a música eletrónica com o fado, com uma missão: “rasgar a máscara que sufocou”. Surgindo, com o objetivo de integrar o próximo álbum dos Karetus, dedicado à primazia dos sons de Portugal, cruzou-se com os acordes da viola da terra. É então que a “obra” nasce, difundindo a tradição e a modernidade “ousadamente”.

Sobre o ponto de partida, é através de um convite realizado pela RTP que a oportunidade surge: “foi uma grande surpresa. Atendendo à história do Festival da Canção, sentimo-nos muito honrados. Chegou-nos como um convite de autores e, depois, surge então a questão se iríamos ser também intérpretes. É quando, em boa hora, o Romeu, que curiosamente se encontra no mesmo local onde estamos a realizar esta chamada (cozinha), se ‘autocandidatou’ para ser o nosso intérprete”, conta Carlos.

O ‘trovador dos Açores’, que é como Carlos e André o apelidam, cumpriu a lenda ou, pelo menos, tentou: “vi a oportunidade de fazer algo, principalmente agora, em que os tempos não são os melhores. Para ser sincero, sempre quis ir ao Festival da Canção e acho que a melhor maneira de o fazer foi, de facto, com malta amiga e que admiro”.

Coincidências do tempo, ou não, os artistas já tinham em mente fazer algo em conjunto – além das partilhas, dos almoços e jantares – alguns beats já se afirmavam, assim como o início da letra, “quando abri a pasta com o embrião (fase inicial da música) e comecei a cantarolar a letra da ‘Saudade’, foi o momento em que tudo aconteceu”, explica Romeu.

Com uma ‘costela’ açoriana, em que o fado, a musicalidade eletrónica e a viola terra, instrumento típico dos Açores, se distinguem, a diversidade cultural que alimenta o trabalho dos artistas sempre esteve presente ao longo do processo criativo.          
Curiosamente, o beat escolhido inicialmente foi aquele que o Romeu menos gostava, no entanto, a transformação levou a um trabalho final que não deixa de reconhecer como “incrível, cheio de personalidade e, acima de tudo, com identidade”, acrescenta.

André afirma que a evolução rítmica foi pensada de forma estruturada: “na estrutura da música, principalmente, quisemos sempre incluir o início, em que quase nem se prevê que vai entrar eletrónica. Queríamos que soasse quase como um fado que se vai desconstruindo para algo diferente.”

A “Saudade” é de todxs. A música. E a que se faz sentir na vida, atualmente. E, por essa mesma razão, Carlos e Romeu contam-nos também que o público abraça a música tornando-a memorável:

“Saudade em tempos de pandemia; um sentimento português, açoriano, apoiado no simbolismo da viola da terra, onde dois corações — o que fica na ilha e o que parte – se unem numa performance caraterística. Isto é Saudade.”

Percorrendo o fator cultural, a saúde mental é também algo que os artistas quiseram refletir no seu trabalho: “o cubo em cima do palco significa o tempo que ficámos confinados em quatro paredes. O segundo verso reflete muito essa questão – ‘Rasga a máscara que sufocou’ – que além das máscaras do dia a dia, ainda que não no sentido literal porque trata-se de uma questão de saúde pública, atribui-se num sentido de exclusão, ou seja, em que as pessoas se escondem atrás das máscaras e vivem oprimidas, não podendo falar dos seus problemas. Todos nós passamos por muito, confinados com as famílias. É certo que muitas dessas pessoas não se conheciam realmente, porque não falam. É também isso que queremos abordar”, explica Romeu.

Agora, “a música não é nossa. É de todxs”. É com as palavras de Romeu que também chegamos a outra reflexão deste conceito musical — quebrar barreiras.
Além do importante significado ligado à saúde mental, é com o mesmo rasgar da máscara que os artistas reconhecem a importância de quebrar estereótipos, critérios obrigatórios e alimentar a liberdade, seja ela cultural, musical ou de pensamento — “há muitos estereótipos em torno da mistura da música tradicional com outros registos”, acrescenta o artista açoriano. Juntamente com André, conta-nos ainda que, no seu caso, inicialmente, estranhou, mas, depois, entranhou e “queria até mais”.

Uma música feita com “rigor”, “sentido” e que pensa temas que criam um momento de reflexão a quem a ouve – é assim que é descrita pelos artistas.

  A viagem a Roterdão não aconteceu, por agora, no entanto, é certo que o ‘grito’ Saudade se recordará na Cultura e no “coração dos portugueses”.

Texto de Patrícia Silva
Fotografia da cortesia de Romeu Bairos e Karetus

Se queres ler mais entrevistas sobre a cultura em Portugal, clica aqui.

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