Há uns meses atrás escrevi aqui sobre o interior e as localidades de baixa densidade populacional. Apesar de existir, há décadas, alertas contínuos sobre os desafios que o interior enfrenta, continuamos afónicos, enquanto nação, na procura de soluções. Temos consciência dos problemas, sabemos que, mais dia, menos dia, terão consequências gravosas e irreparáveis, mas continuamos a adiar decisões obrigatórias.
Nessa altura, lançámos um espaço de discussão sobre estas matérias, o Festival Visit Portugal Descobre o Teu Interior. Sentimos a necessidade de fazer este festival quando se consolidou a ideia de que não há um fórum habitual de debate sobre a situação atual do interior e a discussão de ideias sobre o seu futuro.
Organizámos um programa de três dias, com vários palcos online, cuja centralidade residia nas conversas e apresentações de protagonistas como a Ministra da Coesão Territorial, Ana Abrunhosa, a Secretária de Estado da Valorização do Interior, Isabel Ferreira, o Secretário de Estado do Desenvolvimento Regional, Carlos Miguel, a Secretária de Estado do Turismo, Rita Marques, o ex Secretário de Estado do Turismo, Adolfo Mesquita Nunes, o sociólogo e professor universitário João Teixeira Lopes, a Reitora da Universidade de Évora, Ana Costa Freitas, o antropólogo e fundador da Escola da Ponte, José Pacheco, o presidente da Associação Zero, Francisco Ferreira, representantes da cultura como Rui Horta, Afonso Cruz, Lara Seixo Rodrigues e Tiago Pereira, entre muitos outros. E complementámos a programação com música e cinema vindos do interior do país.
A nossa vontade de fazer ouvir o interior não poderia, no entanto, ficar reduzida a um único momento, a uma iniciativa esporádica e, por isso, inconsequente. Para sermos verdadeiramente íntegros e respeitadores de uma vontade de dar visibilidade a estas discussões, tínhamos de construir um plano constante e coerente.
A primeira decisão foi natural: passar a ter o interior como um dos pilares fundamentais da nossa estratégia editorial, a par da sustentabilidade, dos jovens, da discriminação, da desigualdade e da cultura.
O segundo momento foi tentar contagiar todas as restantes expressões do Gerador com a presença do interior. Alargámos a nossa rede de parceiros a mais entidades do interior do país, criámos condições para que a Academia Gerador chegue a todas as regiões de Portugal, estabelecemos uma regra de discriminação positiva para o recrutamento de trabalhadores que residam no interior e passámos a investigar o interior nos estudos que realizamos.
Esta semana que passou consolidou um terceiro passo: o início do lançamento de publicações e ensaios que tenham na sua centralidade a reflexão sobre o interior. Precisamos de deixar memória escrita sobre estes debates, para que o futuro tenha um ponto de partida.
O Pequeno Livro Aberto sobre o Interior pretende responder, exatamente, a esse desafio de memória, Pareceu-nos, também, que este seria um momento complementar ao Visit Portugal Descobre o Teu Interior, com novas vozes e com pensamentos renovados, servindo de lançamento para uma nova edição do festival em 2022.
O Pequeno Livro apresenta os resultados da sondagem de opinião que fizemos entre março e abril deste ano, uma reportagem de investigação que desenvolvemos sobre o que significa a interioridade, tem textos da Ana Abrunhosa, Ministra da Coesão Territorial, e do Luís Araújo, Presidente do Turismo de Portugal, e ainda conta com um conjunto de entrevistas a pessoas com ligações ao interior do país. Falámos com António Bento Caleiro, docente no departamento de Economia da Universidade de Évora, com Ana Carolina Gomes, antropóloga e redatora da plataforma de informação Interior do Avesso, Catarina Sales Oliveira, Professora Auxiliar no Departamento de Sociologia da Universidade da Beira Interior e com Rita Lucas Narra, bolseira de doutoramento no Instituto de História Contemporânea da Universidade Nova de Lisboa.
Os primeiros passos são sempre pequenos. Daí começarmos com uma edição sintética e prudente. Mas é nossa vontade publicar anualmente um livro que reúna os raciocínios, as análises e as provocações que surgem a cada temporada do festival, sempre completado por visões frescas e inovadoras que vamos descobrindo.
O nosso compromisso em dar voz ao interior é definitivo.
*Texto escrito ao abrigo do antigo Acordo Ortográfico
-Sobre Tiago Sigorelho-
Tiago Sigorelho é um inventor de ideias. Formado em comunicação empresarial, esteve muito ligado à gestão de marcas, tanto na Vodafone, onde começou a trabalhar aos 22 anos, como na PT, onde chegou a Diretor de Estratégia de Marca, com responsabilidades nas marcas nacionais e internacionais e nos estudos de mercado do grupo. Despediu-se em 2013 para criar o Gerador.
É fundador do Gerador e presidente da direção desde a sua criação. Nos últimos anos tem dedicado uma parte importante do seu tempo ao estreitamento das ligações entre cultura e educação, bem como ao desenvolvimento de sistemas de recolha de informação sistemática sobre cultura que permitam apoiar os artistas, agentes culturais e decisores políticos e empresariais.