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Afiar a Língua: Um lindo pôr-do-sol hifenizado

O Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea (Academia das Ciências de Lisboa, 2001) regista a forma hifenizada pôr-do-sol….

Texto de Ana Salgado

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Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea (Academia das Ciências de Lisboa, 2001) regista a forma hifenizada pôr-do-sol.

Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa (Editora Objetiva, 2002; 1.ª edição portuguesa publicada pelo Círculo de Leitores, 2002) regista a locução pôr do sol. Em nota ao verbete refere-se o facto de que, embora o Vocabulário brasileiro registe pôr-do-sol como palavra composta (4.ª edição, anterior à aplicação do Acordo Ortográfico de 1990), o dicionário não o faz, «tanto por ser o pôr um fenômeno astronómico comum a outros astros, como para manter a coerência com a locução opositiva nascer do sol, que jamais se cogitou em hifenizar». Ora, esta observação faz algum sentido, sobretudo, quando fazemos o confronto com nascer do Sol.

Outros dicionários em linha, estes já seguindo o novo Acordo Ortográfico, como o da Porto Editora, serviço Infopédia, apresenta pôr do sol (sem hífenes) como nova grafia, indicando que “a grafia anterior era pôr-do-sol”, no entanto, o da Priberam regista o verbete com hífenes, em nota indica: “Grafia no Brasil: pôr do sol.” (acessos em 27 de Dezembro de 2019).

Vocabulário de Mudança, da responsabilidade do ILTEC (equipa que coordena o Vocabulário Ortográfico Comum), indica pôr-do-sol (Ortografia antiga) e pôr do sol (Ortografia nova). Infelizmente, de nada ou pouco adianta consultar a plataforma do Vocabulário Ortográfico Comum da Língua Portuguesa que, segundo nela se indica, “alberga os instrumentos que determinam legalmente a ortografia da língua portuguesa”. O resultado é: «A forma pôr do sol não se encontra atestada neste vocabulário.» (acessos em 27 de Dezembro de 2019).

Ora, no caso de locuções de uso geral, este vocabulário, oficializado em Portugal, além de aceitar variantes ortográficas para as exceções consagradas pelo uso, indicia (cf. Critérios de aplicação do Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa (1990)) que a nova norma apenas se aplica às sequências constituídas por um nome seguido por preposição e por um outro nome (por exemplo, dia a dia, fim de semana, sem hífen, mas azul-e-branco, leva-e-traz, com hífen). Refira-se ainda que o facto de este vocabulário apenas atestar as locuções registadas no Vocabulário da Língua Portuguesa de Rebelo Gonçalves (Coimbra Editora, 1966) é algo redutor, pois embora ainda seja uma grande obra de referência em língua portuguesa é um vocabulário datado de 1966 e que não regista, por isso, muitas outras estruturas usadas atual e correntemente como, por exemplo, sobe-e-desce e todo-o-terreno. No presente caso, Rebelo apenas regista sol-pôr.

O mesmo acontece com expressões com valor de substantivo: será faz de conta, sem hífenes, ou faz-de-conta, com hífenes? e, afinal, será pôr-do-sol ou será pôr do sol?

Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, publicado pela Academia Brasileira de Letras, regista “pôr do sol”, modificação realizada, na sua 5.ª edição, com a aplicação das novas regras ortográficas.

O que está verdadeiramente em causa? Saber quando uma locução passa a ser considerada como um nome composto. Pôr do sol é uma locução ou será pôr-do-sol um verdadeiro composto?

A questão é de difícil resposta, bastará observar os diferentes tratamentos lexicográficos acima referidos. Há quem prefira registar como locução substantiva (pôr do Sol) e há quem considere o seu grau de fixidez e a sua autonomia de sentido e dita, por isso, o emprego dos hífenes (pôr-do-sol).

A análise mais frequente é a seguinte:

  • se nos referimos à hora a que o Sol se põe e não ao acontecimento em si, devemos escrever pôr do Sol (sem hífenes e Sol com maiúsculas), porque nos estamos a referir ao astro;
  • se nos referimos ao fenómeno, ao momento, devemos escrever pôr-do-sol, com hífenes e sol com minúscula.

«se havia neste mundo uma distracção verdadeiramente aprazível, irresistivelmente tentadora, era passearmos ao melancólico pôr-do-sol entre os sepulcros arrumadinhos de um vasto cemitério bem abastecido de cadáveres» (A. TOJAL, NovísPutos, p. 75).

Será esta análise demasiado rebuscada para um comum falante? Não deveríamos, nós, os que cuidam da língua simplificar estas e outras questões?

Afiando a língua, inclino-me para o tradicional pôr-do-sol, com hífenes, que, para mim, é um composto figurado.

Texto de Ana Salgado
Ilustração de Amalteia

Se queres ler mais crónicas do Afiar a Língua, clica aqui.

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