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Opinião de Vozes Coletivas - Brasileiras Não Se Calam

Defender os portugueses é ser contra os imigrantes?

Nas Vozes Coletivas de hoje, Mariana Braz do Brasileiras Não Se Calam, fala sobre ser contra os imigrantes.

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Basta alguma notícia relacionada a imigrantes em Portugal, seja sobre qualquer assunto, para surgirem comentários xenófobos nas redes sociais. “Os imigrantes vivem às nossas custas!”, “A criminalidade irá aumentar!”, “Portugal vai virar uma favela!”, são alguns dos comentários publicados por aqueles que dizem querer melhorar o país, mas será mesmo que Portugal ficaria melhor se voltássemos para “a nossa terra”? Os números mostram que não. No último ano a população em Portugal aumentou graças ao número de imigrantes que chegaram ao país, e, sem a chegada de imigrantes, só no ano passado, o país teria perdido quase 87 mil pessoas. Sem mulheres imigrantes, também no ano passado, Portugal teria perdido 14 mil bebês, filhos destas mulheres, o que equivale a 16,7% do total de bebês nascidos no país. Sem os imigrantes, em 2022 a Segurança Social teria perdido em contribuições 1500 milhões de euros, e, em 2021, mais de 1200 milhões, valores que são muito maiores do que os valores gastos pelo Estado com esta parte da população. Sem os imigrantes que estudam em Portugal, as universidades portuguesas também teriam perdido quase 70 mil estudantes no ano de 2022. Ainda assim, para alguns especialistas, talvez o número de imigrantes em Portugal ainda não seja o suficiente e, se o número de imigrantes por aqui não aumentar, é previsto que a economia diminua e deixe de funcionar. Já a nível da União Europeia, um estudo feito em 2008 estimou que, sem os imigrantes, a população da UE diminuirá em 52 milhões de pessoas até o ano de 2050.

Gostaria muito de não precisar recorrer a argumentos utilitários e materiais, e poder falar apenas sobre como as trocas culturais podem enriquecer um país e uma sociedade, sobre como podemos aprender sobre participação política e movimentos sociais com pessoas de outros países para lutar por justiça e pelos direitos de grupos socialmente marginalizados também em nossos países, e sobre como podemos trabalhar juntos para construir uma sociedade melhor para todos, mas, infelizmente, vivemos em um mundo cruelmente capitalista, e o que conta é o quanto podemos enriquecer e acumular materialmente, então, toda vez que alguém me diz que Portugal é nosso país irmão por estar facilitando vistos de residência, contratando médicos estrangeiros para viverem cá, e querendo trabalhadores para o setor do turismo, são destes dados que eu me lembro antes de dizer o que a maioria das pessoas esquece: que estamos cá porque precisam de nós. Só o facto de precisarmos escrever sobre isso e trazer dados econômicos que justifiquem nossa presença aqui, já mostra que não somos assim tão bem vindos. Mas, se precisam de nós, porque ainda vemos tantas pessoas defendendo discursos anti-imigração? Eis a questão.

Há uns meses atrás li um comentário de um português nas redes sociais que dizia que, antes, os portugueses precisavam ir até os nossos países para nos escravizar, mas que, agora, nem isso precisam mais fazer, porque nós já fazemos a viagem por nossa própria conta. Não vamos abordar aqui a crueldade desse tipo de comentário, mas, talvez o incômodo dos portugueses que ainda são anti-imigração seja justamente esse: terem de dividir a “Metrópole” com os “colonizados”. Terem de dividir o local de trabalho, as mesas dos cafés e restaurantes, as casas, as praias, os centros comerciais, os hospitais, e o transporte público com africanos e brasileiros. Sabemos que existem muitos portugueses progressistas, mas, infelizmente, também existem muitos que se acham superiores e que ainda não superaram a ideia de que um Portugal colonial que “civilizou” os nossos costumes, que nos ensinou “a falar”, que “salvou” as nossas almas, agora, talvez por carma, tenha de lidar com a mistura dos nossos costumes e palavras (sem imposição nem violência, vale lembrar) na própria “Metrópole”, e com o facto de precisarem dos imigrantes, em sua maioria brasileiros e africanos, para salvar a economia do país. 
Para os que ainda acham que pessoas têm de viver para sempre no país em que nasceram, trazemos também os dados mais recentes, referentes ao ano de 2022, que mostram que existem em Portugal quase 800 mil imigrantes, de todas as nacionalidades, enquanto existem 2.631.559 portugueses emigrados que foram para outros países, e vale lembrar ainda que Portugal tem uma população residente de 10.467.366 pessoas, ou seja, estamos muito longe de constituir algum tipo de ameaça para o país (como já mostramos, é justamente o contrário). Diante deste cenário, penso que temos aqui duas opções: culpar os imigrantes por todos os problemas do país, continuar a dizer “voltem para os vossos países”, e esperar a economia diminuir, ou, acolher os imigrantes que cá estão porque querem construir uma vida melhor no país, e trabalhar em conjunto com eles. É preciso começar a perceber que não estamos em guerra. Que, na realidade, não deveria existir um “portugueses versus estrangeiros”. Vivemos todos aqui e todos trabalhamos para que o país prospere. O inimigo a combater não somos nós, e sim a inflação, a precarização do SNS e da educação, a demora dos transportes públicos, o valor absurdo das rendas, a violência doméstica contra as mulheres, a pedofilia, o racismo, e a xenofobia. Para quem ainda defende um “Portugal para os portugueses”, como se defendesse a existência da pureza de um sangue ariano branco, vale lembrar que os mouros dominaram Portugal durante quase 08 séculos, tendo chegado à Península Ibérica por volta do século VIII, e que Portugal também já pertenceu à Espanha e já foi ocupado por romanos, germânicos, e celtas, isso sem falar na miscigenação entre portugueses e pessoas nascidas nos países que foram colonizados por Portugal e que depois “retornaram”, ou nos filhos de portugueses e imigrantes. Nossa luta até poderia ser por um tapete vermelho, mas, para a maioria de nós, apenas nos sentirmos bem vindos, sem que desrespeitem nossas identidades e nossos direitos, já seria o suficiente.

-Sobre Brasileiras Não Se Calam-

Mariana Braz é psicóloga e vive fora do Brasil há seis anos, tempo em que vem trabalhando com mulheres imigrantes em diversos países, particularmente mulheres que vivenciaram assédio e discriminação motivados por sua raça, etnia, gênero e nacionalidade, e mulheres sobreviventes de violência doméstica. Há três anos desenvolve o Brasileiras Não Se Calam, projeto que tem como objetivo debater as dificuldades enfrentadas por mulheres brasileiras no processo de imigração.

Texto de Mariana Braz
A opinião expressa pelos cronistas é apenas da sua própria responsabilidade.

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