fbpx
Apoia o Gerador na construção de uma sociedade mais criativa, crítica e participativa. Descobre aqui como.

Carta do Leitor: De quanto e qual amor ainda carecemos?

A Carta do Leitor de hoje chega-nos pelas mãos de Leonardo Camargo Ferreira, que inspirado no filme Verão de 85, fala-nos nas múltiplas formas de amor.”Verão de 85 apresenta-se extremamente atual pela complexidade ou mesmo pelo paradoxo que nos revela quanto à afetividade humana. Se pensarmos na quantidade de formas que existem para desenvolvermos o que de bom há em nós, o amor, pensaríamos facilmente estarmos na melhor das alturas da nossa existência para permitir que ele florescesse.”

Texto de Leitor

Apoia o Gerador na construção de uma sociedade mais criativa, crítica e participativa. Descobre aqui como.

Hoje apeteceu-me escrever sobre o amor. O amor que temos e que não temos, que desejamos quando estamos terrivelmente sós e que descartamos nos momentos em que o reconhecemos como garantido. O amor possuído por outra pessoa, na sua versão mais romântica ou em qualquer outra forma que represente um laço de força, de companheirismo, mas nunca continuamente estável, antes atravessando picos e despiques por fazer fluir tão intensas emoções.

Verão de 85 (2020), que assisti nestes dias, foi o filme que me levou a pensar nas cumplicidades que partilhamos. E trago esta palavra, “cumplicidade”, com dois sentidos: o carinhoso e o criminal. No meu 10.º ano tive uma Professora de Filosofia que pouco apreciava o uso deste termo quando aplicado ao namoro ou ao casamento, precisamente pela alusão ao mundo dos delitos e das prisões, um mundo que, à partida, deve ser incompatível com o do afeto. Todavia, será mesmo? Afinal, esta obra cinematográfica, relatando um elo entre dois jovens masculinos apaixonados, alerta-nos para a importância de viver o amor de um modo comprometido, pois de outra maneira experiências de intimidade poderão acabar em tragédias – como a da morte de um dos protagonistas.

Este compromisso, não obstante, é um tremendo desafio na realidade do efémero. Verão de 85 também aborda esta problemática, possivelmente, a meu ver, o mais importante dos temas trabalhados pelo realizador François Ozon. O desencontro entre as cosmovisões dos dois rapazes é mais do que os ciúmes de um deles relativamente ao facto de o outro o ter traído: é o choque interpessoal e mesmo cultural entre a visão do amor envolvente, implicado, incluído, proveniente de uma amizade de confiança extrema (protagonizada por Alex), e a construção de uma juventude pautada pelo divisor máximo comum de práticas, de sensações, do chamado “viver a vida” (arquitetada por David). Perspetivas cuja conciliação, senão impossível, implica frequentemente perdas e submissões de identidades e ascensões de infelicidades, mais tarde reveladas em discussões pesadas.

Ainda assim, haverá flancos para a esperança poder entrar? O filme transmite-nos essa ideia de possibilidade. No início da relação, Alex e David comprometem-se a dançar na campa daquele que falecer mais cedo, uma tarefa hercúlea para o primeiro após o desaparecimento corpóreo do segundo. No entanto, a profundidade do romance que viveram proporcionou a efetivação desta promessa, permitindo acreditar que existem valores pessoais superiores ao da liquidez artificial dos tempos e dos sentimentos, como tão bem nos diria Zygmunt Bauman.

Verão de 85 apresenta-se extremamente atual pela complexidade ou mesmo pelo paradoxo que nos revela quanto à afetividade humana. Se pensarmos na quantidade de formas que existem para desenvolvermos o que de bom há em nós, o amor, pensaríamos facilmente estarmos na melhor das alturas da nossa existência para permitir que ele florescesse. O planeta sempre viveu com desigualdades profundas, mas hoje existe um maior respeito pelas pessoas na sua plenitude, independentemente se estas amam ou são amadas por indivíduos de sexos diferentes ou do mesmo sexo, de cores distintas ou da mesma cor, de idades pouco ou muito semelhantes. A excitação, o prazer, as relações sexuais, por vários lugares, já não são um tabu. Em termos tecnológicos, temos ao dispor formas acessíveis para dialogarmos e estabelecermos encontros de amizade ou romanescos. Ainda assim, presenciamos nada menos que uma lacuna de vínculo, do duradouro, na crença em projetos relacionais com sentido e com franqueza.

Retorno às múltiplas formas de amor do início do meu texto. Perante tanta diversidade, porquê tanto isolacionismo? No que estamos a falhar? (Uma pergunta tantas vezes formulada que chega a ser um lugar-comum.) Ou podemos perguntar: do que já conseguimos, o que nos falta para alcançarmos uma consciência coletiva, como Durkheim propunha através do seu estruturalismo, unida de uma ação individual constitutiva da sociedade, na conceção compreensiva de Weber, em prol da afetividade?

Se quiseres ver um texto teu publicado no nosso site, basta enviares-nos o teu texto, com um máximo de 4000 caracteres incluindo espaços, para o geral@gerador.eu, juntamente com o nome com que o queres assinar. Sabe mais, aqui.
Texto de Leonardo Camargo Ferreira

Publicidade

Se este artigo te interessou vale a pena espreitares estes também

18 Abril 2024

Carta do Leitor: Cidades Híbridas: onde podemos libertar as nossas cidades interiores!

28 Março 2024

Carta do Leitor: Conversa com a minha doença autoimune

7 Março 2024

Carta do Leitor: Guia-modelo de Competências de Liderança

3 Março 2024

Carta do leitor: O profano do sagrado quotidiano

22 Fevereiro 2024

Carta do Leitor: Os blogs empresariais vão sofrer o  efeito Milankovitch este ano

11 Fevereiro 2024

Carta do Leitor: Quem quer comprar um imigrante?

4 Fevereiro 2024

Excerto manifesto anti-exames

28 Janeiro 2024

Carta do Leitor – Desconstruir a Neuronormatividade: um chapéu de cada vez 

14 Janeiro 2024

Carta do Leitor: Stream of consciousness pluvial 

7 Janeiro 2024

Carta do Leitor – “Teias de lítio”: a prova de que os relatórios de impacte ambiental estão a falhar

Academia: cursos originais com especialistas de referência

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Práticas de Escrita [online]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Comunicação Cultural [online e presencial]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Iniciação à Língua Gestual Portuguesa [online]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Fundos Europeus para as Artes e Cultura I – da Ideia ao Projeto

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

O Parlamento Europeu: funções, composição e desafios [online]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Jornalismo e Crítica Musical [online ou presencial]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Planeamento na Produção de Eventos Culturais [online]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Introdução à Produção Musical para Audiovisuais [online]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Iniciação ao vídeo – filma, corta e edita [online]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Planeamento na Comunicação Digital: da estratégia à execução [online]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Narrativas animadas – iniciação à animação de personagens [online]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Pensamento Crítico [online]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Viver, trabalhar e investir no interior [online]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Soluções Criativas para Gestão de Organizações e Projetos [online]

Duração: 15h

Formato: Online

Investigações: conhece as nossas principais reportagens, feitas de jornalismo lento

22 ABRIL 2024

A Madrinha: a correspondente que “marchou” na retaguarda da guerra

Ao longo de 15 anos, a troca de cartas integrava uma estratégia muito clara: legitimar a guerra. Mais conhecidas por madrinhas, alimentaram um programa oficioso, que partiu de um conceito apropriado pelo Estado Novo: mulheres a integrar o esforço nacional ao se corresponderem com militares na frente de combate.

Saber mais

1 ABRIL 2024

Abuso de poder no ensino superior em Portugal

As práticas de assédio moral e sexual são uma realidade conhecida dos estudantes, investigadores, docentes e quadros técnicos do ensino superior. Nos próximos meses lançamos a investigação Abuso de Poder no Ensino Superior, um trabalho jornalístico onde procuramos compreender as múltiplas dimensões de um problema estrutural.

A tua lista de compras0
O teu carrinho está vazio.
0