Aceitamos a existência de vários mundos em simultâneo. Chamamos-lhe o mundo real e o mundo virtual.
Quando era miúda, na escola, ouvíamos várias vezes as expressões “lá fora, vais ver”, “lá fora falamos”, “lá fora depois mostras-me”. Como se o mundo que existia para além da porta da sala de aula, fosse um mundo muito mais permissivo do que aquele que nos prendia ali, sentados nas cadeiras, a fazer trabalhos e a ouvir a professora. As regras deixavam de existir. Ou no mínimo, eram mais fáceis de contornar.
Hoje, quando queremos ir “lá para fora” para um mundo mais permissivo, isso é onde? Onde é que agora encontramos esse mundo?
Vejo as minhas pessoas concentradas à frente dos computadores, dos telemóveis e das televisões a jogarem e a viverem na Internet como se já fosse uma coisa natural… Uma extensão do corpo, quase. O log off é feito ao mundo real. A situação inverteu-se.
Para quê? Creio que a fuga se deva à tentativa, vã, de encontrar um carinho e uma liberdade que já não somos capazes de encontrar no mundo real. Seja porque nos habituámos à facilidade com que as coisas nos vêm parar às mãos, então temos a paciência mais diminuída (jovens e adultos) ou pela simples razão de vivermos fechados, fisicamente, dentro de quatro paredes. Do espaço o nosso corpo não se pode separar, mas o cérebro pode ser enganado. Viramo-nos para o mundo virtual e esperamos que “lá fora” sejamos mais felizes — ainda que por minutos ou horas — e que dê para nos esquecermos do que se vive “aqui dentro”, no mundo real.
O que me preocupa é que, mesmo durante o tempo passado a viver na Internet, não veja felicidade nos olhos das pessoas nem depois veja alívio. É tempo que ficou refém do mundo virtual. Tempo que já não volta. E as pessoas deixam de existir durante aquele tempo, julgam-se entretidas, mas nada prende a sua atenção nem ganha o seu afeto.
Tenho um mau pressentimento sobre esta confusa relação entre os dois mundos e nós humanos. Espero estar enganada.