A 13 de maio de 1981, quando em Fátima se assinalava mais um aniversário das Aparições, o turco Ali Agca disparou dois tiros sobre o papa João Paulo II que o atingiram na zona do abdómen, perante milhares de pessoas incrédulas em plena praça de São Pedro, no Vaticano. Temeu-se o pior, mas João Paulo II conseguiu recuperar dos ferimentos provocados pelas balas e em resposta à tentativa de assassinato, o Papa polaco fez um pedido ao mundo: “rezem por este meu irmão, porque eu já o perdoei”. Agca cumpriu 19 anos de prisão pelo ataque e em 2014 voltou ao Vaticano para deixar rosas no túmulo do antigo chefe da Igreja Católica. Nesse mesmo ano, João Paulo foi declarado santo. Será que perdoar está ao alcance do comum dos mortais? Como fazer para que o ódio não nos invada, não se apodere da nossa sensatez e desperte o pior do que podemos ser?
Oksana perdeu as duas pernas numa explosão de uma mina terrestre, na cidade de Lysychansk, no leste da Ucrânia. Tem apenas 23 anos, dois filhos menores e um mundo de sonhos por realizar, muitos que nunca poderá cumprir. Não foi um azar, foi premeditado e perfeitamente evitável. Decidiu casar com Viktor no hospital, perante o olhar enternecido do mundo, uma mensagem de esperança e crença no futuro, mesmo sob as mais difíceis circunstâncias. O amor entre os dois venceu esta luta, mas será que o ódio ganhará a guerra? Saberá Oksana curar a sua dor, focar-se na recuperação e não se deixar envenenar pela raiva? Haverá motivos, contextos e situações que justifiquem ó ódio? Pode Oksana odiar Putin, os seus seguidores e, na generalidade, todos aqueles que se acovardaram perante esta guerra e mesmo assim viver em paz?
Odiar quem nos magoou de forma propositada, cruel e absoluta fará de nós más pessoas? Talvez sim. É o poder transformador do ódio, que corrói, deteriora o corpo e a alma, deixa-nos ocos de sentimentos bons. Na realidade, impede-nos de avançar, mantém-nos agarrados ao passado, valoriza o visado e enfraquece-nos. O ódio é venenoso, desgastante e intoxica-nos. Talvez seja legítimo odiar, até justificável, mas valerá a pena, quando o maior lesado somos nós mesmos?
Há dias, Zelensky defendia que: "O ódio vai acabar por desaparecer. Os ditadores morrerão". Sejamos honestos que o ódio não termina com a morte de quem nos magoou, não desaparece apenas porque as circunstâncias mudaram. Mas de facto a história tem confirmado que as emoções negativas associadas como a raiva, o nojo e desprezo tornam-se, com o passar do tempo, menos intensas, menos visíveis e aparentemente curadas. Seguir em frente é o único caminho. Deixar de odiar é um processo lento, uma reconciliação que não tem que passar necessariamente pela dimensão do perdão, caso não tenhamos essa grandeza. Ultrapassar o ódio é darmos uma oportunidade à nossa felicidade sem que o sofrimento dos outros nos faça felizes.