A ansiedade é amiga do criador. Qualquer artista ou criador que se preze tem F.O.M.O. (Fear of Missing Out) vive em V.U.C.A. (Volatility, Uncertainty, Complexity, Ambiguity). Edward Munch fez um autorretrato da sua própria alma, quando pintou O Grito, expondo uma profunda crise existencial e mental.
A arte é feita para ser vista. Das mais diversas formas, das mais diferentes maneiras.
A redução de toda a arte e manifestação cultural ao formato de um ecrã é um facto inédito. Nunca antes existiu esta impossibilidade de contacto físico com a arte.
Nunca como antes a arte foi tão importante.
Ao ser constantemente mediatizada dá-se, quer queiramos quer não, um processo de afastamento e desmaterialização. O simples facto de não podermos contactar com ela nas suas mais diversas formas, predominantemente materiais, táteis, palpáveis, sensoriais transforma o objeto artístico num artefacto valiosíssimo pela sua capacidade de ativar a reflexão, de distender o tempo e de permitir o sentimento.
Num tempo de permanente assédio informativo, de confusão entre notícias e conceitos, entre apelos e ideologias, entre verdades e mentiras, temos de nos proteger da estupidez da mesma forma que nos protegemos do vírus.
E a arte com estratégias de libertação.
Este novo pânico não é bem a boa ansiedade criativa ou existencial. É um pânico silencioso, que se acomoda aos pequenos espaços, onde encaixamos agora a vida. É um pânico que nos põe num estado de permanente mediação tecnológica e interação social.
Coisas que anteriormente até considerávamos contraditórias com a fruição de arte. O ecrã está lá entre nós e o objeto artístico, está a qualidade da captação e de transmissão, estão os mecanismos de interação social.
Mas está lá também uma vontade estranha. Vemos agora uma arte que tenta dominar o meio, explorá-lo, provocá-lo e ao seu eterno efeito sobre a mensagem. Uma arte que faz da manipulação e instrumentalização deste meio menos material a arma para que a sua compreensão se emancipe do espartilho da veiculação.
E está lá também na sua mais profunda missão. A de combater o medo.
*Esta é uma crónica do Pedro Pires, inicialmente publicada na Revista Gerador de julho.
-Sobre o Pedro Pires-
É CCO/CEO da Solid Dogma. O que quer dizer que é criativo, mas que também tem outro tipo de responsabilidades enquanto não aparecem outras pessoas que façam melhor o serviço. É o autor da crónica «Constructo Constritor» na Revista Gerador.