Uma das notícias mais curiosas que li durante o estado de emergência foi o conselho dado pela primeira-ministra islandesa para abraçar árvores enquanto não se pode abraçar pessoas. Depois de limpos os caminhos ainda cheios de neve, quem quisesse podia ir à floresta para abraçar as árvores. Esse abraço, segundo os mais entendidos, produzia um efeito de relaxamento profundo que permitia enfrentar o dia de forma muito mais positiva. Quando li esta notícia, lembrei-me imediatamente do que senti quando, na adolescência, me abracei a uma árvore para evitar que a cortassem. Nesse dia, os funcionários da CML teimavam em serrá-la pela base, em vez de apararem os ramos quebrados, algo que me parecia a medida acertada. Lutei e venci essa batalha. O «meu» querido choupo acordava-me todos os dias com o chilrear de mil pássaros e, ao pôr-do-sol, comovia-me com o seu cantar. Crescemos juntos, ele cada vez mais alto, e eu cada vez mais adulta. Foi um abraço especial como tantos outros que tive.
Um abraço forte é um ato de uma enorme proximidade. Não há nada mais reconfortante do que abraçar e ser abraçado por quem se gosta, corpo contra corpo numa união perfeita. O abraço é especialmente gratificante e íntimo quando conseguimos acertar a respiração e o batimento cardíaco com o outro. Muitas pessoas têm dificuldade em ter proximidade física. O abraço nem sempre faz parte do kamasutra comportamental de um casal e, às vezes, só acontece dissimulado durante o ato sexual. Quando acompanho pessoas que têm receio de proximidade física, quer por terem sido privadas de afetos ao longo da sua infância, quer por timidez, sugiro que se inscrevam em aulas de dança. A dança quebra barreiras, tal como a música. E focadas num objetivo de aprendizagem, muitas conseguem ensaiar o seu primeiro abraço, pondo de lado as suas reservas. Os seus corpos, outrora rígidos, aprendem, de forma singular, as vantagens do contacto físico e da proximidade. Depois de aprender a dançar, qualquer pessoa está inevitavelmente mais habilitada para abraçar a intimidade. E enquanto isso não é possível, porque não dançar com as árvores?
*Esta é uma crónica da Marta Crawford, inicialmente publicada na Revista Gerador de junho.
-Sobre a Marta Crawford-
É psicóloga, sexóloga e terapeuta familiar. Apresentou programas televisivos como o AB Sexo e 100Tabus. Escreveu crónicas e publicou os livros: Sexo sem Tabus, Viver o Sexo com Prazer e Diário sexual e conjugal de um casal. Criou o MUSEX — Museu Pedagógico do Sexo — e é autora da crónica «Preliminares» na Revista Gerador.