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Crise climática – votar não chega

Hugo Paz fala-nos sobre a urgência de uma ação coletiva na luta contra a crise climática e a insuficiência do voto como solução diante da guerra declarada pelos interesses corporativos e governamentais.

Texto de Redação

Fotografia da cortesia de Hugo Paz

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Em Outubro, o Climáximo, um coletivo horizontal; aberto; anticapitalista e pela justiça climática, aceitou a terrível realidade de que governos e empresas declararam guerra unilateralmente às pessoas e ao planeta. Em 24 fevereiro de 2022, o povo ucraniano aceitou que a Rússia declarou guerra unilateralmente. Muito antes de 7 de outubro, o povo palestiniano aceitou que o estado de Israel não só declarou guerra, como também anunciou o genocídio de um povo que há décadas vivia num sistema de apartheid. Em todas estas guerras só um parâmetro se altera: a sua dimensão. Nenhuma delas pode ser travada apenas com o voto.

Existe uma parte de ucranianos que, apesar de não ouvirem mísseis caírem, aceitam que também estão em guerra. Isto deve-se não só à grande extensão do território ucraniano, mas também à existência de ucranianos que procuram um futuro diferente noutro país (antes ou depois da guerra eclodir). Quando olhamos para Gaza é difícil encontrar uma criança que nunca tenha ouvido ou sentido os efeitos dos ataques do estado de Israel. Numa escala totalmente diferente está a guerra que governos e empresas declaram às pessoas e ao planeta. A escala é mundial e as consequências ameaçam a existência de civilização futura.

À medida que as bombas caem, as emissões não param de aumentar. Isto levou a que o ano de 2023 tenha sido o mais quente de que há registo, com as temperaturas do Oceano Atlântico a atingirem máximos nunca antes observados. A nível global, governos e empresas planeiam queimar até 2030 mais do dobro dos combustíveis fósseis do que o que seria compatível com manter o aumento de temperatura abaixo de 1,5ºC. Nenhum dos membros do G20 está atualmente a reduzir emissões a um ritmo compatível com as metas de neutralidade carbónica. Um mundo em que o aumento de temperatura chega aos 2ºC é um mundo onde há muito mais de mil milhões de refugiados. O número é tão grande que as consequências são impossíveis de imaginar. São os mesmos refugiados que vinte II Guerras Mundiais, que duzentas invasões da Ucrânia. Há neste momento alguém em quem possas votar que proponha parar esta guerra?

Entretanto, governos e empresas correram uma vez mais a encher os corredores da COP28 com as pessoas que durante décadas travaram a ação climática, negaram o problema, criaram desinformação e culparam as vítimas - as pessoas mais pobres - pelos seus crimes. É difícil imaginar uma COP diferente desta, porque são todas assim. Os importantes fundos de reparação de perdas e danos não têm dinheiro, e continuam a não ser feitos cortes. Aliás, o aumento de emissões continua ano após ano. A guerra contra nós não só continua como aumenta todos os anos. É tempo de encontrar uma alternativa de cooperação e coordenação internacional, onde a resposta à crise climática é dada por pessoas normais.

As eleições que vão acontecer não contemplam um futuro viável quando não colocam a crise climática no centro. A "normalidade" que será discutida por todo o mundo são 41 milhões de crianças refugiadas climáticas nos últimos seis anos, número que crescerá exponencialmente ano após ano. Precisamos de um plano que coloque a vida no centro. As empresas fósseis continuam com lucros históricos, obtidos através da aceleração da guerra e do nosso colapso. Como conseguiremos um acordo de não proliferação de armas de destruição massiva com os novos projetos que a Galp quer fazer em África? Vai ser com um voto de quatro em quatro anos?

Não podemos consentir com estes crimes. Não consentimos com mega projetos que inevitavelmente levam à morte de milhões de pessoas, e ao sofrimento de muitas mais. Não consentimos que haja uma classe que acredite que nós não vamos fazer nada para travar os seus planos.

Não sabemos o que vai ser uma sociedade pós-capitalista. Precisamos de um debate totalmente diferente para isso, muito menos contaminado por medo de bichos papões inexistentes para esconder as ameaças reais. Precisamos reforçar o consenso científico inequívoco à volta da crise climática e da sua resolução. Temos de travar coletivamente o aumento de emissões. Ao mesmo tempo, precisamos de reduzir emissões em grande escala, o que implica acabar com os lucros e com a atividade mortal da indústria fóssil.

Na guerra que nos foi declarada, vou sofrer eu, a minha família, amigas e amigos, mas principalmente muitas pessoas cujos nomes não sei e que em nada contribuíram para promover e coordenar o massacre social em curso. O plano da Rússia é destruir a Ucrânia. Os ucranianos resistem. O plano do estado israelita é o genocídio do povo palestino. Aquele povo resiste. O plano deste sistema é  destruir tudo o que amamos. Vais resistir ou achas que votar chega?

- Sobre Hugo Paz -
Licenciado em Química Aplicada na Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa, decidiu que não era enfiado num laboratório que se iria sentir realizado. Estudou no Mestrado de Ciências Gastronómicas, mas foi em Comunicação de Ciência que encontrou conforto no trabalho que desenvolve. Desde cedo está ligado ao associativismo, ora pela Sociedade Filarmónica Euterpe Meiaviense, ora pela anTUNiA. Nestes espaços aprendeu a trabalhar com pessoas e desenvolveu uma paixão pela música, nomeadamente pelo saxofone. Desde 2020 que se interessa ativamente pela crise climática, tendo participado em várias ações de desobediência cívil pacíficas, andou 400 km desde Leirosa até Lisboa. Viu os locais mais afetados pela crise climática, ouviu histórias de pessoas afetadas e visitou os locais com mais emissões. Desde então só esta luta fez sentido.

Texto de Hugo Paz

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