No final deste mês de março, a MPAGDP (Música Portuguesa a Gostar Dela Própria) inaugura o seu espaço próprio a que chamou de CURA.
Segundo as palavras do Tiago Pereira, o seu fundador, CURA significa “a Ação do tempo e celebra todo o nosso trabalho de registo audiovisual da memória coletiva portuguesa, dos últimos 100 anos”.
A MPAGDP existe desde 2011 e, fruto em grande parte da teimosia do Tiago, vem desde aí a registar a tradição oral portuguesa que se concretiza em milhares de vídeos publicados no site. Com este registo, chega-nos um olhar que não sendo académico, é próximo e emocional, centrado nas pessoas que habitam os vídeos e partilham generosamente um saber que é tão ancestral como atual. O Tiago tem a sensibilidade de, a cada gravação, se desviar do nosso campo de visão como criador e dar lugar à pessoa e à paisagem e com isso permite uma relação mais empática com o que estamos a ver. Percebemos que o que se diz e se canta nos vídeos existe, porque existe a paisagem, a casa, o bairro, a taberna e que é nesse complemento que existem as pessoas.
E é em cima desta cultura diversa e plural, como é o país, que a MPAGDP insiste em registar aqueles que compõem os alicerces do que podemos chamar tradição e identidade, alicerces esses que, por serem muitas vezes quase invisíveis, vamos gradualmente esquecendo quando olhamos para a forma como muitas vezes se pensa, comunica, promove e trabalha identidade. Numa altura em que as entidades regionais apostam cada vez mais nessa identidade, é fundamental que a entendam como um resultado do que existe e faz parte do território, muito mais que uma construção simplificada, muitas vezes imaginada. Muito mais que uma capital do porco, uma feira do cogumelo ou uma festa do enchido, precisamos de iniciativas e campanhas que se elevem à complexidade e pluralidade das pessoas que lá existem. Sabendo nós, à partida, que uma comunicação turística é sempre um resumo, ou uma sobre simplificação, é melhor que esta surja de um entendimento claro dos alicerces onde se vai construindo.
Como muitas vezes acontece, corremos o risco de vermos a verdadeira importância da MPAGDP reconhecida muito mais à frente no tempo. Não façamos do trabalho do Tiago arqueologia, façamos dele atualidade, inspiração e verdade. Reflexo do chão que pisamos.
A Cura é a representação material deste projeto, o espaço físico que o centraliza. Vale uma visita a Serpins. O Tiago, se não estiver a gravar pelo país, lá estará para vos receber.
A CURA: Rua José Simões Cortez n.º 1, 3200-329 Serpins
-Sobre Miguel Bica-
O Miguel gosta de fazer coisas acontecer e de pensar como se constrói uma experiência, na sua relação com o público, com os artistas, o espaço e o ecossistema em que ela se insere. Colaborou em festivais de cinema como o IndieLisboa e o Doc Lisboa e foi gestor do projeto PTBluestation. Em 2014 foi um dos fundadores do Gerador, é hoje vice-presidente e director de produção e é dele a responsabilidade de materializar as inúmeras iniciativas que aí vão sendo produzidas. É formador de planeamento em eventos culturais na Academia Gerador e orientador de projecto final no curso de produção de eventos na World Academy.