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Palhetas Perdidas: Cantaloupe

Localizado nos históricos mercados da cidade de Olhão, e com uma vista para a ria…

Texto de Redação

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Localizado nos históricos mercados da cidade de Olhão, e com uma vista para a ria Formosa, que não deixa ninguém indiferente, o Cantaloupe é, hoje em dia, uma das referências culturais da cidade e um dos mais relevantes espaços com música ao vivo da região do Algarve.

Para tal sucesso, terão por certo sido determinantes a dedicação e experiência de Louis Leger, de 58 anos, proprietário do bar desde a sua génese em 2006. Oriundo do centro de França, Louis vive em Portugal desde 1992, tendo também explorado no passado o clube B-Flat no Porto. Com uma paixão assumida por jazz, que dura desde que em 1984 assistiu em Viena a um concerto de Miles Davis, e com conhecimento profundo do modo de funcionamento dos clubes de jazz de Paris, onde estudou música, Louis procurou adaptar o modelo desses mesmos clubes às diferentes realidades que foi encontrando, primeiro no Porto e depois em Olhão.

No caso do Cantaloupe, se hoje em dia este tem já o seu espaço na vida cultural da cidade solidificado, e se a zona histórica onde está situado tem hoje uma dinâmica cultural bastante forte, é importante não esquecer o percurso feito desde o seu início, defende o proprietário: “Quando peguei no bar, esta zona era marcada por muita violência à noite. O bar tinha horário de abertura às 17 horas, tendo por isso um caráter noturno, e eu não queria fazer concertos à noite naquele ambiente. Por outro lado, durante o dia o espaço exterior do clube era na altura destinado a estacionamento durante o dia.” A esplanada do Cantaloupe, cujo potencial já era antevisto por Louis, foi a primeira a surgir das muitas que atualmente ocupam aquela zona, hoje em dia livre de carros, fruto do esforço e luta do dono do bar.

Ao longo dos seus 13 anos de atividade, o maior destaque na programação do clube vai para o ciclo dos domingos à tarde, que mantém uma regularidade semanal desde 2008. “Ao início tinha a ideia de fazer concertos na sexta e sábado à noite. Com o passar do tempo fui reparando que era difícil fazer isso nesses horários com toda a confusão que havia por esta zona, e que, por contraste, aos domingos à tarde não se passava nada” explica Louis. Desse modo, arrancou então o ciclo de concertos sob o nome “Domingos ao pôr do sol” que se mantém até hoje, levando à zona do mercado de Olhão quase 50 concertos por ano. Assumindo o desafio que é manter essa regularidade face à ausência de uma comunidade de músicos de jazz sólida naquela região, Louis acredita que, sendo hoje em dia uma das referências enquanto espaço para música ao vivo no Algarve, o Cantaloupe acaba por integrar o circuito nacional de clubes de jazz, recebendo projetos nacionais e também internacionais: “É frequente termos músicos a virem desde Sevilha para tocar cá”, exemplifica, referindo também que a programação está sempre fechada a 3 meses, face à quantidade de propostas que recebe.

No entender do proprietário, o Cantaloupe veio dessa forma dar resposta à necessidade de um clube naquela região: “Quando abrimos em 2006, nesta zona havia já um ou outro festival a acontecer no Algarve, havia figuras marcantes por cá como o Zé Eduardo, mas não havia um clube”, refere, considerando a existência de um sítio onde os músicos possam tocar essencialmente, tanto para a comunidade como para o processo de aprendizagem dos próprios músicos. Por outro lado, defende também a importância da comunidade de músicos para a sobrevivência e saúde de um bar. “Sem músicos é impossível ter um bar de música ao vivo”, assume. Nesse sentido, dá como exemplo um grupo de jovens músicos que na altura descobriu o clube pela mão do contrabaixista Zé Eduardo, e que incluía músicos como Charlie Roussell ou Eddie Jensen, hoje em dia residentes no estrangeiro. “A primeira vez que cá vieram tocar, o mais velho desse grupo tinha 20 anos e o mais novo 16”, lembra, demonstrando o papel que o Cantaloupe teve no percurso destes músicos, e ao mesmo tempo reconhecendo a importância que estes tiveram no crescimento do clube.

Se é verdade que o Cantaloupe se assume como um clube de jazz, a verdade é que o significado desta palavra é, para o proprietário, muito mais abrangente do que o que se tende a crer. Falando do seu percurso enquanto amante do estilo, remete-nos novamente para o concerto de Miles Davis a que assistiu em 1984, e para a fase estética que o norte-americano atravessava nessa altura. “O jazz é uma música viva, é uma musica social, que está sempre a mudar”, defende. Na programação, é, portanto, possível encontrar uma variedade de propostas que vão desde o jazz mais tradicional a outros concertos que, sendo mais distantes dessa linguagem, mantêm segundo Louis o espírito e energia do estilo.

Em complemento ao ciclo de domingo à tarde, o bar não fecha a porta a concertos em outros dias da semana. Durante 5 anos, as quintas-feiras foram noites de jam sessions semanais, sendo que com o passar do tempo a regularidade passou para uma quinta-feira por mês; à vista de quem faz a entrevista encontra-se também um cartaz a anunciar um triplo concerto da banda de afro-reggae Thomso que, segundo nos explica Louis, já acontece nesta altura nos últimos 3 anos, em jeito de celebração do fim do verão. Nos meses de inverno, com os concertos a acontecerem no interior do clube, há também lugar para exposições de pintura que alternam mensalmente, defendendo o dono do bar que o cruzamento das várias artes sempre fez parte das suas intenções para o projeto do Cantaloupe.

Lembrando o peso que o turismo tem numa cidade que se estabeleceu nos últimos anos como estância turística, o proprietário assume a preponderância de público estrangeiro, não deixando de explicar as diferenças entre o público nos meses de verão e de inverno. “Olhão tem uma população flutuante: muita gente que vive cá, nos meses de verão aluga a casa a terceiros para fugir à confusão do Algarve e ir para o seu país de origem. Essa dinâmica leva a que o público que temos mude muito entre as épocas de verão e inverno.”

Independentemente da altura do ano, uma condição mantém-se, contudo: quem frequenta tem de respeitar os músicos que tocam. Cadeiras viradas para o palco e o silêncio durante os concertos são regra, segundo o proprietário, que rejeita a ideia do jazz como música de fundo. “Se querem falar, ou não querem ouvir a música tão alto, têm sempre outras opções aqui ao pé. Tento explicar-lhes que a música não está alta nem baixa, está como tem de estar porque é assim que ela é, não fazendo sentido ser de outra forma.” Uma luta constante, segundo Louis, especialmente durante os meses de verão, onde o turismo atinge o seu ponto alto.

Fruto do trabalho e paixão do seu proprietário, da boa relação dos músicos que por lá passam com aquela casa, sem esquecer o papel dos colaboradores do bar, cujo trabalho é essencial para sustentar um espaço com música ao vivo, o Cantaloupe foi crescendo, e com ele cresceu toda a vida cultural daquela zona. Da parte de quem aqui escreve e por lá já tocou, fica a nota pessoal de que é um espaço que não deixa ninguém indiferente, seja músico ou público.

Texto de João Espadinha
Fotografia da cortezia de Cantaloupe

Se queres ler mais crónicas do Palhetas Perdidas, clica aqui.

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