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Parlamento dos Jovens regista recorde de adesão: estudantes querem aprofundar os mecanismos de participação do projeto

Quase 300 mil estudantes do ensino básico e secundário estiveram envolvidos nas diferentes fases da edição 2022/2023 do “Parlamento dos Jovens”. A iniciativa é da Assembleia da República e tem como um dos principais objetivos aproximar os jovens estudantes da Casa da Democracia. Os participantes sublinham o impacto positivo do programa, mas não deixam de apontar algumas características a melhorar: desde aspetos técnicos, aos contactos com os deputados e à falta de efeitos práticos dos debates desenvolvidos.

Texto de Débora Cruz

Ilustração de Marina Mota

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Em maio último, 132 estudantes do 2.º e 3.º ciclos de ensino básico e 132 estudantes do ensino secundário, sentaram-se no plenário da Assembleia da República como deputados. Não eram as diferenças ideológicas ou partidárias que definiam os seus lugares, mas sim os diferentes círculos eleitorais pelos quais tinham sido eleitos. O objetivo era debater o tema Saúde Mental nos Jovens. Que desafios? Que respostas? para, em conjunto, elaborar um Projeto de Recomendação para a Assembleia da República. Apesar das divergências de opinião em torno das medidas a adotar, os estudantes tinham em comum a iniciativa que os levou até à Casa da Democracia: a 28.ª edição do Parlamento dos Jovens.

No site do Parlamento, o projeto é anunciado como o “maior programa de educação para a cidadania ativa, em Portugal”. Oficialmente, a iniciativa “procura estabelecer-se enquanto espaço privilegiado de promoção da participação cívica e política dos jovens, aproximando-os dos deputados e envolvendo a comunidade escolar na construção de um processo eleitoral que tem como mote a reflexão e o debate sobre um tema comum”.

Ana Rita Laranjeira é coordenadora do programa do Parlamento dos Jovens, desde 2021, e faz um “balanço muito positivo” desta edição, destacando um novo recorde de participação , com mais de mil escolas inscritas. A coordenadora destaca também o grande interesse dos jovens na temática discutida. “O tema em debate, nesta edição do programa, foi provavelmente um dos mais consistentes naquilo que foi a escolha de votação dos jovens, notou-se um grande compromisso no debate.” 

Na sessão nacional do ensino secundário, realizada nos dias 29 e 30 de maio último, Inês Silva foi à Assembleia da República como porta-voz do círculo eleitoral de Aveiro. “É muito gratificante participar neste projeto, porque saímos de lá a sentir que temos alguma voz”, avalia a jovem de 17 anos. Para a estudante, a oportunidade de diálogo com os deputados e partidos políticos já é uma oportunidade a ser valorizada. “Aquelas medidas, colocadas em prática ou não, foram olhadas por deputados e pelos partidos. Acho que é gratificante sentirmos isso e também aprendermos muito com o que estamos lá a fazer.” 

A estudante frequenta o 12.º ano na Escola Secundária Ferreira de Castro, em Oliveira de Azeméis, e participa no Parlamento dos Jovens desde o 7.º ano. Conseguiu chegar à sessão nacional três vezes, mas, devido à pandemia, só no ano passado foi à Assembleia da República: “Foi uma experiência que mudou a minha vida”, conta Inês Silva sobre esta nova fase. “Foi a primeira vez que fui à sessão nacional presencial: é uma experiência muito marcante, porque temos um contacto muito mais próximo com as pessoas e [podemos ver] como as coisas funcionam.”

Esta edição também não foi a estreia de Manuel Pinto como deputado. O estudante frequenta o 12.º ano na Escola Secundária Camilo Castelo Branco, em Vila Real, e descobriu o programa por meio da sua professora de Português, no 8.º ano. “Na altura, [a professora] lançou-me o desafio de participar. Fui, mas participei apenas na sessão distrital, tal como no 9.º ano, só no secundário é que passei para a sessão nacional”, explica. Este ano, participou enquanto porta-voz do seu distrito. “É uma experiência incrível e que pode dar muito a Portugal”, assevera o jovem de 18 anos, “é uma experiência que cativa desde o primeiro momento”.

Manuel Pinto numa das Comissões Parlamentares do ensino secundário. Fotografia retirada do site do Parlamento dos Jovens

O estudante de Vila Real acredita que o principal fator de atratividade do projeto é o espaço para o debate e o confronto de ideias. “Alguém que está atento à política nacional e que participe, vê outra geração. Vê uma capacidade de argumentação completamente diferente e que nos atrai mais, porque é mais próxima dos jovens: é mais moderna e traz conhecimentos diferentes”, sustenta. Manuel Pinto acredita que a sessão nacional é uma “experiência marcante” para qualquer participante, desde jornalistas a suplentes e porta-vozes. “Mesmo que não fales ao microfone, a experiência que vais ter nos corredores e na troca de ideias com estes jovens brilhantes e com um coração gigante é simplesmente espetacular.”

Por sua vez, Rita Lapão destaca também o impacto da sessão nacional. “É uma experiência muito emotiva, lembro-me de estarmos todos a cantar o hino nacional a olhar uns para os outros e a pensar que somos o futuro”, recorda, “tenho a certeza de que todos os que estavam presentes vão lutar por aquilo que acreditam, acho que é isso que motiva os jovens”. A estudante de 17 anos vive em Estremoz e participou nesta edição como deputada do círculo eleitoral de Évora. No ano passado, participou na iniciativa como jornalista e considera que ambas as experiências são gratificantes, com atribuições diferentes. “Acho que a maior diferença é que os jornalistas podem movimentar-se no meio do plenário para tirar fotografias e os deputados podem falar, enquanto que os jornalistas não. Mas ambos aprendem muitas coisas importantes de formas muito parecidas.”

Rita Lapão numa das Comissões Parlamentares do ensino secundário. Fotografia retirada do site do Parlamento dos Jovens

Este ano, a Escola Secundária Gaia Nascente, em Vila Nova de Gaia, conseguiu eleger, pela primeira vez, o porta-voz do círculo eleitoral do Porto. O cargo foi conquistado por Diogo Teixeira, que foi acompanhado pela colega de turma, Beatriz Santos, à fase final do evento. “A parte mais enriquecedora do projeto é a forma como nos vamos conectar com os outros colegas e perceber como funciona o trabalho de um deputado”, diz Diogo Teixeira. Beatriz Santos também destaca a proximidade com os deputados da Assembleia da República. “O mais marcante foi quando tivemos oportunidade de ter um contacto direto com os deputados e fazer-lhes perguntas.”

Já Miguel Marinho, de Vila Real, enfatiza o impacto positivo do projeto para os participantes, mas adianta que existem muitos aspetos que poderiam ser melhorados. “Acho que o modelo em si não está errado, mas o tempo que é disponibilizado para as pessoas debaterem é muito pouco”, exemplifica. O jovem de 19 anos já participou em diferentes edições e dá conta de que, ao longo dos anos, tornou-se expectável quem participaria na iniciativa, reivindicando diferentes formas de a promover junto dos estudantes. “[O Parlamento dos Jovens] é um bocado um funil de um grupo muito específico, acho que era um espaço que devia ser aberto a mais gente.”

Muitos dos estudantes que participam no Parlamento dos Jovens tomam conhecimento do projeto por meio das suas escolas e professores. Ana Rita Laranjeira caracteriza mesmo os docentes envolvidos como os “grandes impulsionadores” do programa. “Desde logo, têm um papel importante junto das direções das escolas para promover a inscrição. Depois, há todo um trabalho que precisa de ser construído e que, na verdade, é fruto do empenho dos professores que se envolvem”, defende. Dado o caráter extracurricular do programa, a coordenadora frisa que sem o compromisso dos professores que acompanham os jovens, a organização não poderia falar do sucesso das diversas edições.

Sessão nacional do ensino básico. Fotografia retirada do site do Parlamento dos Jovens

As fases do Parlamento dos Jovens e a sua evolução ao longo dos anos

O projeto tem sofrido várias alterações ao longo das suas quase três décadas de existência, desde a primeira sessão, a 17 de fevereiro de 1995, do então designado Parlamento das Crianças e dos Jovens. A iniciativa foi da responsabilidade da então deputada Julieta Sampaio, do Partido Socialista (PS), que convidou 80 jovens das Áreas Metropolitanas do Porto e de Lisboa a debaterem, na Assembleia da República, os direitos da criança, recriando o formato de uma sessão parlamentar. Hoje, qualquer jovem do 2.º ou 3.º ciclos do ensino básico e secundário, de qualquer escola do continente, das regiões autónomas e dos círculos da Europa e de Fora da Europa, pode participar, desde que a instituição de ensino envie a respetiva candidatura.

A partir de 2006, o Programa adotou o formato que aplica hoje, com várias fases ao longo do ano letivo. Apesar de semelhantes, as atividades desenvolvidas pelos estudantes dos 2.º e 3.º ciclos do ensino básico são independentes das desenvolvidas pelos jovens do ensino secundário. 

A primeira fase corresponde à Sessão Escolar, aquela que, no que diz respeito ao número de participantes, tem um alcance mais alargado. Esta fase decorre nas escolas inscritas na iniciativa, onde se inicia o processo eleitoral construído em torno do debate de um tema. Os estudantes formam listas candidatas à eleição de deputados e realizam a campanha e o respetivo ato eleitoral, onde é aprovado o Projeto de Recomendação da escola e onde são eleitos os respetivos representantes às sessões a nível distrital ou regional. Nas sessões distritais ou regionais, os deputados que representam as escolas de cada distrito ou região autónoma reúnem-se para aprovar os Projetos de Recomendação a submeter à sessão nacional, e eleger os deputados que os vão representar nessa última fase. 

O programa culmina com a realização das duas sessões nacionais, do ensino básico e do secundário, na Assembleia da República. Nesta fase, os jovens deputados, representando cada distrito, região autónoma e o Círculo da Europa e de Fora da Europa, reúnem-se e aprovam, após o debate em Comissões e em Plenário, a Recomendação final sobre o tema daquela edição. O tema é definido anualmente sob proposta dos jovens, de entre os temas aprovados nas diferentes sessões distritais e regionais.

Para além dos deputados representantes das escolas eleitas, os trabalhos são sempre conduzidos por uma Mesa de jovens eleitos e, desde 2005, as sessões nacionais têm registado também a participação de jovens jornalistas, que acompanham as escolas eleitas e se candidatam ao prémio Reportagem Parlamento dos Jovens. Nesta edição do programa, registou-se um total de 58 jornalistas, no ensino básico, e de 59 jornalistas, no ensino secundário. No final de cada edição, as recomendações aprovadas pelos estudantes deputados são apreciadas pela Comissão de Educação e Ciência e podem ser implementadas ou influenciar medidas tomadas pelo Governo e pelos Grupos Parlamentares.

Briefing dos jornalistas do ensino secundário. Fotografia retirada do site do Parlamento dos Jovens

A participação recorde das escolas e dos estudantes

Segundo os dados disponibilizados pela Coordenação do Programa, estiveram envolvidos na edição de 2022/2023, cerca de 197 mil estudantes, nas 524 escolas inscritas no ensino básico, e cerca de 193 mil, nas 504 escolas inscritas no ensino secundário. Nas sessões escolares, que abrangem um universo ainda maior de jovens, registaram-se cerca de 216 mil votantes. Contabilizaram-se ainda 4313 turmas envolvidas na constituição de listas candidatas à sessão escolar e 2993 listas candidatas.

Os estudantes da Escola Secundária Gaia Nascente já participam no Parlamento dos Jovens há cerca de cinco anos. Sandra Rodrigues, adjunta do diretor e coordenadora da iniciativa na instituição, faz um levantamento positivo do projeto e do impacto que tem nos estudantes. “É uma forma de aproximar os jovens daquilo que se passa na política, porque muitos deles não fazem ideia de como se realiza todo o processo eleitoral, desde a constituição de listas à lei da paridade ou às regras do debate e da campanha”, explica, “o projeto permite uma lição de democracia, porque [os jovens] estão a trabalhar em termos práticos”.

Enquanto coordenadora do projeto na escola, Sandra Rodrigues é responsável pela divulgação e por auxiliar os estudantes no processo eleitoral, assim como enviar os documentos necessários para assegurar a participação. “Depois de perceberem o processo, conseguem conduzir os trabalhos sozinhos, apenas intervenho se algo estiver menos bem para os ajudar”, explica.

Para a coordenadora, a iniciativa é única no panorama nacional. “É uma oportunidade que os miúdos poderão ter de perceberem se gostariam de seguir esta área, no futuro. Mesmo que não queiram, é importante que percebam que podem participar nas suas comunidades, que a voz deles é importante e que podem participar democraticamente.”

A primeira vez que a Escola Secundária Gaia Nascente se candidatou à iniciativa, os estudantes organizaram quatro listas e, este ano, contabilizaram sete. “[Para] muitos dos nossos jovens, este é o único contacto que têm com deputados da Assembleia da República, no dia em que estão na nossa escola. De outra forma, acho que não teriam essa oportunidade, e o envolvimento dos estudantes posso classificá-lo como excelente.”

A coordenadora refere-se ao envolvimento dos deputados da Assembleia da República nas três fases do programa. Na primeira fase, as escolas podem enviar pedidos para que os deputados participem nos debates das sessões escolares. Já as sessões distritais ou regionais incluem um período para perguntas que podem ser colocadas a um deputado. Na última fase do programa, no primeiro dia, as reuniões em Comissão são presididas por deputados e, no segundo, o Plenário inclui um período de perguntas com a participação de todos os partidos com representação parlamentar.

Para a diretora da Escola Secundária Camilo Castelo Branco, Helena Correia, o Parlamento dos Jovens simboliza uma oportunidade de simular o processo das eleições legislativas e da participação na vida da sociedade, assim como a possibilidade de pôr em prática o conceito de “cidadania ativa”. “Aproveitamos essa oportunidade com o objetivo de promover e de incentivar o trabalho democrático dos alunos, quer no básico, quer no secundário”, declara, “para os incentivar a participar, a refletir sobre problemáticas diversas e a serem mais interventivos.”

A diretora dá conta de que a participação dos estudantes na iniciativa, ao longo dos anos, tem vindo a aumentar a intervenção dos estudantes nas escolas. “Nota-se uma diferença muito grande ao nível dos alunos que participam nas associações de estudantes. Temos verificado que não se preocupam apenas com o baile de finalistas ou com atividades de torneios na escola, penso que o Parlamento dos Jovens lhes trouxe essa vontade de serem mais interventivos.”

Sessão nacional do ensino secundário. Fotografia retirada do site do Parlamento dos Jovens

A participação cívica e política dos participantes

A participação política e cívica de Manuel Pinto começou antes de participar ativamente no Programa. No ano passado, era presidente da Assembleia da Associação de Estudantes da Associação de Estudantes do Liceu Camilo Castelo Branco e, este ano, foi eleito presidente. Além disso, o jovem pertence à Juventude Socialista (JS) e, há cerca de dois meses, tornou-se no Coordenador dos Estudantes Socialistas do ensino básico e secundário, uma organização autónoma da JS. 

O estudante acredita que o seu interesse pela política é fruto das suas circunstâncias. “Todos somos frutos de circunstâncias: os nossos pais e professores, os livros que lemos, as situações que presenciámos”, conta. “Desde que me candidatei à Associação, passei a perceber as dificuldades que os jovens sentem e o que se passa nas escolas portuguesas. Acho que foi daí que veio o gosto e o interesse em participar, de ter uma voz cada vez mais ativa e de representar os estudantes.”

O jovem de Vila Real julga que os participantes constituem, na sua maioria, uma “elite muito característica de classe média”. “Por mais que tentem trazer os problemas de todos os jovens, é sempre difícil representar todos, porque, se calhar, têm visões muito diferentes e um bocadinho mais fechadas nas suas bolhas políticas e económicas do que a restante população jovem.”

Miguel Marinho frequentou a mesma escola que Manuel e, tal como ele, participou pela primeira vez no Parlamento dos Jovens quando frequentava o 8.º ano. Uma professora incentivou-o e, como gostava de falar em público, aceitou o desafio. “Organizámos uma lista com uns amigos, fomos à sessão distrital e passámos à nacional. Foi o meu primeiro contacto e acabei por ser o representante de distrito nessa edição.” No ano passado, participou pela última vez e decidiu experimentar a modalidade de jornalista, acabando por vencer o Prémio Reportagem Multimédia.

O jovem de 19 anos frequenta atualmente o curso de Ciência Política e Relações internacionais, na Universidade da Beira Interior. Em retrospetiva, acredita que os estudantes que participam no Parlamento dos Jovens são, sobretudo, aqueles que tinham já uma participação política e cívica ativa, acabando o projeto por não atrair os mais distanciados. “Não é culpa da organização, até porque é um evento extremamente bem organizado e super benéfico para toda a gente, [mas] um dos erros principais é precisamente o de que não devia atrair só o pessoal que está diretamente ligado à política”, adverte. “Se calhar, faz mais falta aos jovens afastados do que aos que estão ligados à política.”

O estudante julga que se fosse adotada uma abordagem diferente na promoção da iniciativa, poderia ser mais produtivo. “No meu caso, notei que os professores têm uma tendência a escolher os alunos que demonstram mais capacidades, o que é natural”, explica. “Por vezes, não se focam tanto na questão de espalhar o evento para toda a gente, mas sim de ‘escolher’ [estudantes], para tentar levar a escola à sessão nacional, por exemplo, tipo uma seleção de competição.”

Na Escola Secundária Gaia Nascente, Diogo Teixeira admite que já era expectável o envolvimento das pessoas que mais participaram nesta edição, e na sessão nacional teve a mesma sensação. “Quem mais participou foi quem já se esperava: quem participa mais e quem tem mais interesse neste tipo de iniciativas da escola”, afirma. “Sou relativamente conhecido na escola, porque participo em todo o tipo de projetos, e o Parlamento dos Jovens não foi exceção. No ano passado, fiz parte da Associação de Estudantes e costumo estar metido neste tipo de iniciativas.”

Diogo Teixeira na sessão nacional do Parlamento dos Jovens do ensino secundário. Fotografia retirada do site do Parlamento dos Jovens

Ainda assim, a coordenadora do Programa acredita que a iniciativa da Assembleia da República tem a potencialidade de chegar aos estudantes que não tenham já uma participação política e cívica ativa. “Não só acredito, como acho que essa é a grande mais valia do programa”, confessa, “desde o momento em que os jovens se predispõem a constituir listas, estará ao seu alcance e na sua decisão de se organizarem para tal.”

Quando Inês Silva foi eleita para a sessão nacional pela primeira vez, já se interessava por política, mas “não fazia nada quanto a isso”. “Quando cheguei à [sessão] nacional do ano passado, foi quase uma realidade nova, como cair de paraquedas e perceber que há pessoas que também estão interessadas e que percebem muito mais do que eu”, confessa. Depois da fase final, a estudante manteve contactos com alguns dos colegas deputados e, até hoje, falam sobre diferentes temas num grupo de WhatsApp que criaram.

A jovem diz ter conhecido “pessoas fantásticas” que a fizeram descobrir um “mundo que não sabia que existia”, nomeadamente, o das juventudes partidárias. “Ao longo deste ano fui pensando um bocadinho mais nisso e decidi, no dia da nacional, filiar-me numa”, revela. “Se me dissessem há um ano que ia filiar-me, se calhar, ria-me. Apesar de ter essa vontade para aprender e para agir, foi com o Parlamento dos Jovens que percebi que era possível.”

Vítor Gonçalves frequenta o 12.º ano e, nesta edição, foi eleito deputado pelo círculo eleitoral de Coimbra. “Sempre vivi numa terrinha muito pequena e, portanto, sempre houve o sentimento de família e de comunidade: a ideia ir a casa do meu vizinho ajudá-lo, por exemplo. Não sei se isso me pode ter influenciado, se calhar, foi daí que surgiu o meu bichinho [pela participação cívica e política]”, conta o jovem de 18 anos. O estudante considera natural que existam jovens que não tenham interesse em participar no Parlamento dos Jovens ou que não queiram sair da sua zona de conforto. “O que penso ser essencial é que o programa consiga captar os jovens que estão no intermédio: os que até gostam de política, mas a família não discute”. 

O estudante acredita que se fossem estabelecidos mais contactos entre a classe política e os jovens, estes últimos poderiam desenvolver mais o seu interesse. “Se quem já está dentro do ‘sistema’ for às escolas e tiver uma conversa com os jovens, acho que tira muito o elefante da sala que muitos podem ter acerca de políticos e, consequentemente, promover a participação.”

A promoção da participação cívica e política e o “hiperformalismo” da sessão nacional

No documento de apresentação do Parlamento dos Jovens, lê-se que um dos objetivos da iniciativa é o de estimular “o gosto pela participação cívica e política”. Ao recriar atos eleitorais e o processo de decisão do Parlamento, o projeto adquire, no entanto, uma índole institucional. Segundo o Estudo sobre a Participação Política da Juventude em Portugal, publicado, em 2022, pela Fundação Calouste Gulbenkian, os jovens tendem a optar por meios não convencionais de participação, como dar dinheiro ou recolher fundos para uma atividade social, cívica ou política ou assinar petições.

Manuel Loff pertence ao Grupo Parlamentar do PCP e foi um dos autores do relatório A participação política dos jovens vista por dentro, inserido no estudo publicado pela Gulbenkian. O deputado não considera que o Parlamento dos Jovens tenha o potencial de aproximar os jovens da participação política convencional, mas reconhece o valor e a importância dos debates realizados nas sessões escolares e distritais. “Acho que o sistema de debate e a preparação do Parlamento dos Jovens à escala de cada uma das escolas, onde o caráter mais institucional praticamente não existe, ou pelo menos é muito menos visível, é globalmente positivo”, sustenta. 

No entanto, Manuel Loff sublinha que o caráter “hiperformal” da sessão nacional o surpreendeu de forma negativa. “Creio que [a fase final] está totalmente impregnada de uma visão que acho inadequada, que é a visão institucionalista”, assevera. “No momento em que todos os estudos nos dizem que é justamente a dimensão estritamente institucional que, mal ou bem, afasta ou, pelo menos, não atrai os jovens para a participação política, partidária e eleitoral”, explica, “parece-me totalmente inadequado reproduzir e, suponho, convidar os jovens a reproduzir fielmente o estilo, o modo e toda a simbologia dos trabalhos parlamentares.”

Manuel Loff, do Grupo Parlamentar do PCP, a responder às questões dos deputados do ensino secundário. Fotografia retirada do site do Parlamento dos Jovens

Miguel Marinho também reconhece que, por vezes, a linguagem utilizada pelos deputados na sessão nacional não parecia ser espontânea, mas antes uma reprodução do Parlamento. “Vês aquilo quase como uma encenação e acho que não é suposto ser, reparas que está ali a acontecer alguma coisa que não é natural. Os discursos, a forma de gesticular, os próprios berros e a entoação, tudo isso acaba por ser muito artificial”, conta. “Parece que estão ali a incorporar alguém que pensam ser naquele momento e não é isso que se quer. É [sobre] dares aos jovens o espaço para serem eles mesmos, porque não queres mais cópias. Queres coisas diferentes: [pessoas] que façam as coisas, que resolvam os problemas e que falem de formas diferentes.”

Ainda assim, o estudante reconhece que o próprio formato da iniciativa incita os jovens a agirem dentro destes moldes de participação. “Acho que todo o formato [incentiva], se calhar também é isso que eles [a organização] querem. No fundo, provocar que sintas que estás ali a ter importância”, hipotetiza. Foi esta “encenação” que fez com que Miguel Marinho tenha gostado mais da experiência que teve no Parlamento dos Jovens do ensino básico, por sentir que a experiência foi mais genuína. “Acho que é muito diferente, até mesmo a maturidade nos miúdos e as próprias relações que crias com as pessoas: encaras o projeto de uma maneira distinta, é muito melhor a experiência no básico.”

Sobre a hipótese de o Programa aproximar os jovens da participação política mais convencional, Ana Rita Laranjeira sustenta que não é esse o papel da iniciativa. “O nosso papel enquanto Parlamento dos Jovens é aproximar a Assembleia da República das escolas e as escolas da Assembleia da República”, atesta, “não lhe punha aqui um cunho de ser mais dentro do formato daquilo que é esperado ou do que não é esperado.” A coordenadora sublinha que o Programa vai continuar a acompanhar as necessidades dos jovens, com o objetivo de lhes dar voz.

A descredibilização das vozes dos jovens e os efeitos práticos das recomendações

O relatório A participação política dos jovens vista por dentro dá conta de que existe um sentimento generalizado entre os jovens de desvalorização das suas vozes. “Toda/os a/os participantes afirmaram que sentem não serem levados a sério por “adultos” ou pela “sociedade”, em geral, ou seja, fora dos coletivos/movimentos a que pertencem, por diversos fatores”, lê-se.

A idade, inexperiência, a precariedade laboral e a dependência económica são indicados como possíveis fatores que explicam a desvalorização das opiniões dos mais novos. “Acho que somos alvo de muita condescendência”, diz Miguel Marinho. “Somos encarados com uma certa indiferença, [a classe política] até pode ouvir-nos, mas não noto consequências”, defende. “Acho que os jovens são o grupo na História que, provavelmente, mais impacto teve, [mas], cada vez mais, a população, em Portugal, por ser envelhecida e ter uma educação completamente diferente, desvaloriza-nos muito e isso é um erro.”

Manuel Pinto partilha da mesma opinião. “É verdade que na política nacional, e um bocadinho por todo o globo, os jovens são desvalorizados. Mas, também é verdade que as grandes transformações da sociedade se fizeram através dos jovens e dos estudantes, e esse papel histórico ninguém nos pode tirar”, atesta. O estudante de Vila Real acredita que o Parlamento dos Jovens é demonstrativo do interesse, da qualidade e da participação política dos jovens, em Portugal. “É uma iniciativa excelente que demonstra aquilo que sei há algum tempo: os jovens têm capacidade para participar na política nacional e — vou ser ousado — [de participar] par a par com os nossos deputados.”

Para Diogo Teixeira, quem convive com os jovens consegue perceber o seu interesse e capacidades. Ainda assim, o porta-voz do círculo do Porto sente que as vozes dos mais novos são desvalorizadas. “Continuamos a ouvir dizer que somos o futuro, mas quando queremos dizer algo, não nos é dada a palavra. Quando tentamos correr mais um bocado e deixar de ser a sombra dos principais líderes políticos, são-nos cortadas as pernas porque somos muito novos, muito radicais, ou não queremos saber disto.”

Inês Silva diz sempre se ter preocupado com causas sociais, mas confessa que até à participação no programa, sentia que a sua voz não tinha impacto. “O Parlamento dos Jovens foi o único sítio em que realmente senti que estava alguém do outro lado a ouvir, [e] que não estava a falar um bocadinho para o boneco. Nas outras áreas da sociedade, os jovens são olhados como incapazes por não terem uma maturidade ou um estudo académico que os faça ter o conhecimento político que os deputados da Assembleia da República têm. [Mas] não é verdade, [os jovens] vivem no mundo real como qualquer outra pessoa.”

Inês Silva na sessão nacional do Parlamento dos Jovens do ensino secundário. Fotografia retirada do site do Parlamento dos Jovens

O formalismo e institucionalismo da iniciativa pode ajudar a entender este sentimento. “Sinto que se consegue ver que aquilo é institucionalizado e parece que somos mais crescidinhos, talvez se possa considerar mais maturo e intelectual”, hipotetiza Vítor Gonçalves. “Mas, fora do Parlamento dos Jovens, se não tiveres uma postura muito normativa, uma boa fala e uma boa postura, é muito fácil ser descredibilizado e dizerem-nos que têm muito mais experiência de vida que nós”, explica. “Acredito que outras pessoas, como ativistas, possam ter sido caladas ou parado de ter algum impacto social, por não se sentirem integradas, por sentirem que estão fora do normal.”

Para Inês Silva, o processo eleitoral em cada fase da iniciativa é um fator de credibilização. “[O facto de] termos sido eleitos até chegar à Assembleia da República faz com que tenhamos um certo reconhecimento. Os jovens que estão na sessão nacional tiveram que passar por todo um percurso até chegar lá, o que mostra como são capazes e aptos. Sendo [uma iniciativa] institucional, reconhecida pelo governo, isso implica que os deputados estejam lá e estejam a ouvir-nos, quer queiram, quer não.”

Apesar do reconhecimento, os estudantes ouvidos no Parlamento dos Jovens nem sempre sentem que os projetos de recomendação e as discussões que desenvolvem têm efeitos práticos. “Acho que [a iniciativa] tem mais impacto nos jovens do que propriamente nos outros”, declara Miguel Marinho. “[O Parlamento dos Jovens] cria nos estudantes a ilusão de estarmos ali naqueles moldes onde já estiveram os outros [deputados]. É por isso que te vais comportar de certas maneiras e ter um discurso mais robotizado”, explica. “Essa ilusão do espaço faz com que os jovens se sintam assim. [Quando participei] no básico, sentia-me como um deputado, mas quanto mais te apercebes das coisas, mais essa ilusão vai passando.”

Vítor Gonçalves considera que os debates entre os participantes e o contacto com a Assembleia da República e os deputados são sempre produtivos. Ainda assim, o estudante do círculo de Coimbra gostaria que as discussões surtissem mais efeitos práticos. “[O Parlamento dos Jovens] é mais uma celebração da democracia e dos jovens do que propriamente uma oportunidade para implementar mudanças. É muito bonito fazer política para a política, só que depois não surge nada para a sociedade”, defende. Por outro lado, Inês Silva sublinha que a presença dos jovens na Assembleia da República envia já uma mensagem para a classe política portuguesa. “Enquanto estivermos lá, os deputados vão sabê-lo, quer olhem depois para as medidas que aprovámos, quer não, têm a noção de que há uma camada jovem que quer dizer que está aqui e que quer fazer isto.”

A coordenadora do programa do Parlamento dos Jovens explica que, depois de aprovado o projeto de recomendação, este éentregue ao Presidente da Assembleia da República. As medidas seguem depois para apreciação, para a Comissão de Educação e Ciência, e são também remetidas às instâncias governamentais que têm a competência específica para os temas em debate. Nesta edição, Ana Rita Laranjeira explica que os resultados desta recomendação seguem muito em linha com as competências do Ministério da Saúde e o Ministério da Educação. 

“Há uma ação imediata de divulgação e que, esperamos, também de retorno relativamente às medidas adotadas”, reitera. “Muitas vezes, isto acontece já fora do tempo de intervenção dos jovens que estiveram envolvidos nesta recomendação, em particular para os do ensino secundário.” A coordenadora explica que o momento em que as propostas possam ter algum impacto direto em legislação ou em medidas mais concretas que possam ser implementadas, dá-se já dois ou três anos após a recomendação aprovada. A coordenadora não esquece, contudo, a emergência que exigem alguns dos temas e medidas. “Os jovens e os tempos em que vivemos pedem também alguma urgência na ação e na consequência e, muitas vezes, isso não é compatível com as próprias agendas e com a necessidade de maturar e concertar algumas posições.”

Apesar da incompatibilidade de agendas, a coordenadora do programa assegura que os poderes e atores políticos estão interessados e envolvidos em todo o processo. “Há um grande compromisso institucional da Assembleia da República, mas também dos senhores deputados”, reitera. Nesta edição, o programa recebeu mais de 500 convites a deputados para debates nas escolas e a equipa conseguiu responder a cerca de 500. “Mostra bem que houve aqui um compromisso gigante do universo de deputados na Assembleia da República para participar em debates nos diferentes círculos, de norte a sul, até às ilhas”, refere. 

Para as escolas do círculo da Europa e de Fora da Europa, foi também possível organizar debates por videoconferência para que os deputados estivessem envolvidos com estes jovens.

Sessão nacional do ensino básico. Fotografia retirada do site do Parlamento dos Jovens

A relação entre os deputados e os participantes

A possibilidade de contactar com os deputados da Assembleia da República, em todas as fases do Parlamento dos Jovens, é destacada pelos participantes como uma experiência muito positiva. Para além dos momentos que preveem interações entre ambos, os jovens sublinham também as conversas que têm com os deputados fora do projeto. Os estudantes dão conta de que, após o fim de cada edição, é frequente serem contactados por partidos, juventudes partidárias ou deputados que encorajam a sua filiação ou a participação em diversas atividades, sobretudo, se forem porta-vozes dos seus círculos eleitorais.

Após a edição deste ano, Inês Silva conta que foi contactada por deputados e juventudes partidárias. “Penso que é uma das coisas boas que os deputados podem fazer, porque mostram-nos que há alguém do outro lado a ouvir-nos e que considera que tivemos uma presença que seria uma peça essencial na sua juventude”, argumenta a porta-voz do círculo de Aveiro. “Acho bem que o façam, porque nunca forçam ninguém a nada, pelo menos, nunca tive essa experiência de me sentir pressionada.”

O porta-voz do círculo do Porto admite também já ter sido contactado após o Parlamento dos Jovens e reporta uma experiência distinta. “Já fui abordado por todos os partidos que estão na Assembleia da República e pelo CDS. Há uma vontade enorme dos partidos de adquirir os jovens que se interessam por política como se fossem jogadores de futebol”, assevera Diogo Teixeira. “Andam atrás de nós, tentam manter contactos e fazem, a maior parte das vezes, uma pressão gigante para que nos filiemos a eles ou a algum partido próximo deles. Isso é um problema muito grave.”

O estudante sente, contudo, que este tipo de dinâmicas não prejudicaram o Parlamento dos Jovens, visto que os contactos acontecem após o término de cada edição. Além disso, considera que se não existir pressão, os contactos podem ser positivos. “Não há problema nenhum se tiver sido por vontade dos jovens. Qualquer pessoa deve ter direito a acreditar no que quiser e a seguir a ideologia política que quiser, sem qualquer limitação.”

Vítor Gonçalves já participou em duas edições do Parlamento dos Jovens e diz já ter sido contactado por deputados e uma juventude partidária, mas nunca se sentiu pressionado para se filiar ou participar em quaisquer atividades. “Acredito que existem outros jovens que são puxados e incentivados, nem é pela ideologia, porque quem contacta nem sequer conhece as [suas] orientações políticas ou valores, é mais pelo aproveitar: ‘Já que comunicas bem e consegues passar uma mensagem, vamos ver se te alinhas’ ou ‘Já que sou deputado e uma figura de autoridade, será que consigo puxar?’”, conta.

O jovem do círculo de Coimbra acredita que pode existir um “aproveitamento” dos participantes do projeto, mas sublinha que alguns podem considerar positivos os contactos estabelecidos. “Cada um tem a sua missão no Parlamento dos Jovens: a minha missão é a participação cívica, mas sei que existem pessoas que já têm juventudes partidárias, então é uma forma de terem algo para além da juventude. Aí, ganham por estar num projeto que é conhecido e têm muito mais oportunidade de chegar mais longe.”

Miguel Marinho considera que é frequente os jovens participarem no Parlamento dos Jovens, em parte, pelas possíveis oportunidades decorrentes do seu envolvimento no projeto. “No ano passado e este ano, consegui perceber que as pessoas, principalmente no secundário, estão lá mais por uma questão de mostrarem quem são e de se darem a conhecer do que propriamente fazer algo em conjunto”, diz. “No básico, é uma dinâmica completamente diferente, até porque os miúdos que vão, estão lá para outra coisa, acho que é levado um bocadinho mais na desportiva”, conta, “no secundário, nota-se uma competição muito maior, consegues perceber que as pessoas estão ali por outras razões.”

O deputado do Grupo Parlamentar do PCP, Manuel Loff, foi o responsável por responder às questões que os jovens deputados direcionaram ao partido, nas sessões nacionais do ensino básico e secundário. “A grande maioria das questões pareceu-me bem formulada e escolheram-se bem as questões colocadas a cada partido, nomeadamente as colocadas ao partido no poder, o PS.” O deputado faz um balanço geral positivo da participação e qualidade de intervenção dos participantes. “Acho que, em ambos os casos, há uma seleção de jovens que, do ponto de vista cultural, talvez até político, estão bastante preparados e têm uma boa capacidade de argumentação”, reconhece, “não tenho dúvidas nenhumas de que, no caso do ensino secundário, vários deles já são militantes partidários, e isso nota-se.”

Sobre os contactos estabelecidos entre os deputados ou partidos e os jovens participantes, Manuel Loff considera-os “inevitáveis”. O professor universitário é deputado independente, visto que não é militante do PCP, mas desconhece se o partido contacta ou não os jovens. “Sei bem que, na realidade, a militância partidária não decorre, na maioria dos casos, através de um clique no site do partido, mas através de gente que contacta outras pessoas e acho totalmente legítimo que se contacte”, atesta. “Gostaria que fossem contactados porque partilham ideias [ou porque] participam em associações, movimentos ou instituições com as quais um determinado partido ou organização política se sente próximo nessa área.” 

A coordenadora do programa do Parlamento dos Jovens considera que não se deve pronunciar quanto a este tipo de situações, visto que extravasam o âmbito de atuação do programa. No entanto, admite que são “apenas um reflexo daquilo que é o mais salutar na democracia” e que “faz parte da vida num país que se rege por princípios e valores democráticos.”

O Presidente da Assembleia República, Augusto Santos Silva, com a presidente da Mesa da sessão nacional do ensino Básico, Lara Ribeiro. Fotografia retirada do site do Parlamento dos Jovens

O voto eletrónico, o tempo para discussão e a visibilidade mediática do Parlamento dos Jovens

Muitos dos jovens admitem não conseguir apontar aspetos negativos às suas experiências no Parlamento dos Jovens. Rita Lapão garante que a iniciativa a fez conhecer de perto as instituições democráticas e estimulou o seu sentido crítico. “A partir do Parlamento dos Jovens, comecei a gostar muito mais de filosofia e a questionar muito mais as coisas. Comecei, de facto, a defender aquilo que acredito e a conhecer novos pontos de vista”, conta. A jovem sente que o projeto foi aquele que mais a enriqueceu a nível individual e intelectual. “Foi extremamente positivo para o meu desenvolvimento”, admite.

Já Inês Silva destaca os contactos e as amizades que fez durante os anos em que participou no projeto. “O Parlamento dos Jovens não ficou na Assembleia da República, criou-se uma comunidade de pessoas com vontade de participar e fez com que pudesse haver uma aprendizagem contínua da nossa parte.” A estudante considera que a iniciativa “abre muitas portas para o mundo” e, por isso, é necessário dar-lhe destaque. “Tem que ser valorizado e ter mediatismo, as pessoas têm que saber que existe e o que é que faz”, defende.

Ainda assim, a estudante de Aveiro destaca alguns aspetos que reconheceu como falhas. “Falta o contacto com os deputados. Se o Parlamento dos Jovens é um sítio para os jovens serem ouvidos, deveria haver um momento em que se pudesse conversar e conviver com os deputados [fora do plenário], para que possamos esclarecer as nossas dúvidas até ao fim.” Além disso, sublinha que o sistema de votos não é o mais adequado. “As votações após os debates na generalidade da sessão plenária, deveriam ser por computador”, explica. As votações foram feitas de forma manual e tiveram, por vezes, de se repetir as contagens, pelo que considera que o voto eletrónico seria o mais adequado. Manuel Pinto partilha da opinião da deputada de Aveiro: “Se a votação fosse feita de forma eletrónica, para além de melhorar a gestão do tempo, também não se alterava o sentido do voto por influência dos outros”, explica.

A coordenadora do programa do Parlamento dos Jovens dá conta de que as votações têm sido feitas sempre nestes moldes. “Na última revisão do regimento do programa, já estão previstos vários formatos de votação e que já são aplicados, designadamente, nas sessões distritais. Há algumas votações que já são feitas em formato eletrónico”. Ana Rita Laranjeira reconhece que há um “caminho a fazer” e que a equipa vai traçá-lo em edições futuras, de forma a aprimorar as várias formas de votação. 

Para Diogo Teixeira, o principal aspeto a melhorar seria ter mais tempo reservado para o debate de ideias, nomeadamente nas sessões nacionais e nas sessões distritais dos círculos com maior número de participantes. “Se calhar, iria já ser um investimento muito grande, mas será que não justificaria também mais ideias e um aproveitamento maior de todos os jovens? Se tivéssemos mais tempo para falar, criaríamos um projeto final mais coeso e trabalhado, e teríamos todos a ganhar com isso.”

Diogo Teixeira numa das Comissões Parlamentares do ensino secundário. Fotografia retirada do site do Parlamento dos Jovens

Ana Rita Laranjeira frisa que o programa tem um formato “quase voluntário” e extracurricular, pelo que é “difícil consertar aquelas que são as obrigações do calendário do programa com as atividades letivas”. Desta forma, a coordenadora reconhece que é um “desafio” poder alargar a sessão nacional”. Porém, garante que a equipa vai estar sempre disponível para implementar melhorias dentro das suas possibilidades.

Vários jovens lamentam também que esta edição do Parlamento dos Jovens tenha estado associada aos protestos dos estudantes contra as declarações da deputada Rita Matias, do Chega, no segundo dia da sessão nacional do ensino secundário, quando esta foi questionada acerca da discriminação sofrida pela comunidade LGBTQIA+. “É um projeto que não envolve partidos e penso que se devia distanciar ao máximo do Parlamento português. Não sei até que ponto é que bater nas mesas, sair da sala e fazer protestos não é, de certo modo, estar a replicar vícios que vemos na televisão”, confessa Vítor Gonçalves.

O estudante considera que os participantes se focaram excessivamente nas declarações da deputada, concedendo-lhe, nas redes sociais, mais visibilidade e desviando a atenção da iniciativa. “Muitas vezes, fala-se que a comunicação social só dá destaque a certas vertentes e polémicas, mas aqui não houve comunicação social e, no entanto, foi o que mais se falou no Parlamento dos Jovens, entre os deputados. Claro que é importante [protestar], [visto que] é defender a democracia, mas não sei até que ponto não estamos a ser ingénuos.”

As recomendações finais aprovadas

No final da sessão nacional do ensino básico, no dia 9 de maio, e do encerramento da sessão nacional do ensino secundário, no dia 30, os projetos de recomendação finais foram aprovados. Em cada sessão, foram redigidas dez medidas com o objetivo de dar resposta aos problemas sentidos pelos jovens ao nível da saúde mental.

Manuel Pinto considera que debater o tema desta edição foi muito importante para os jovens. “A pandemia da covid-19 trouxe a degradação da nossa saúde mental, mas também teve a vantagem de alertar a minha geração e o mundo para a sua importância”, explica. “Percebi que com stress e pressão — como costumo dizer — não teremos geração: se o mundo não der oportunidades a estes jovens, acho que isso vai ter consequências dramáticas e vamos ser completamente máquinas formatadas, sujeitas a ter esgotamentos ou a entrarem em depressão e declínio.”

Quando soube o tema que ia ser debatido nesta edição do Parlamento dos Jovens, Inês Silva admite que, inicialmente, ficou um pouco desiludida, mas depois foi-se apercebendo da importância de falar sobre a saúde mental dos jovens. “Penso que havia outros temas que precisavam de ser debatidos, mas à medida que fomos avançando no projeto percebi a relevância do tema que estávamos a tratar. Entendi que o tema diz muito a muitos jovens e que ainda há muitas coisas que podem ser feitas, das quais não tinha noção.”

Para consultares o Projeto de Recomendação final do ensino básico, podes clicar, aqui

Para consultares o Projeto de Recomendação final do ensino secundário, podes clicar, aqui

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