fbpx

Apoia o Gerador na construção de uma sociedade mais criativa, crítica e participativa. Descobre aqui como.

BEM COMER #24

As condimentadas crónicas semanais de Manuel Luar  É fascinante a história da alimentação em geral,…

Texto de Margarida Marques

Apoia o Gerador na construção de uma sociedade mais criativa, crítica e participativa. Descobre aqui como.

As condimentadas crónicas semanais de Manuel Luar 

É fascinante a história da alimentação em geral, sobretudo tendo em conta as influências que alguns povos e culturas exerceram sobre outros povos e outras culturas.

Nesse aspecto a “vanguarda ibérica da civilização ocidental” (nas palavras de Arnold Toynbee) destacou-se muitíssimo. Não só levando para os novos mundos outras técnicas de cozinhar e outras tradições gastronómicas, como trazendo para a velha Europa alimentos até então desconhecidos.

“Tempura” no Japão, vem da palavra lusitana “Têmpora”, época do ano em que existia no mundo cristão a proibição de ingerir carnes. As Quatro Têmporas, que caem na quarta-feira, sexta-feira e sábado da mesma semana, ocorrem em conjunção com as estações, quatro vezes por ano.

Nessas alturas os portugueses utilizavam a fritura com polme para peixes e frutos de mar. Técnica que introduziram no Japão. E ainda hoje, embora os japoneses comam “tempura” em qualquer dia do ano, nunca a associam à carne, apenas a executam com peixe, marisco e vegetais.

Ao contrário, merece reflexão pensar que o nosso riquíssimo espólio de receitas de doces conventuais só foi possível por causa dos Descobrimentos, democratizando a utilização do açúcar que embora fosse conhecido há milhares de anos na Europa apenas embarateceu com a utilização dos Engenhos de Açúcar do Brasil.

Para cá vieram também o “milho”, o “café” e o “cacau”, a “canela”. A “noz-moscada”, a “pimenta”, o “gengibre” e as outras especiarias que, mais ou menos, fizeram parte da nossa cultura gastronómica.

Para já não falar da omnipresente “batata”. Foram os soldados de Francisco Pizarro, explorador do Peru, que por volta de 1530 introduziram este tubérculo na Europa, embora fosse já cultivado pelos Incas desde tempos imemoriais, chamando-lhe pappa.

Uma das histórias interessantes sobre estas trocas e baldrocas que muito acrescentaram ao património cultural da humanidade é a da “feijoada completa”, prato de culto no Brasil ao qual Chico Buarque dedicou uma célebre canção.

Trago para aqui a competência de Carlos Alberto Dória, Henrique Carneiro e Câmara Cascudo, sociólogos, antropólogos e especialistas em história da alimentação. Com base nesses especialistas é possível concluir que na génese da famosa “feijoada brasileira” estaria o “cozido à portuguesa”…

Antes que mandem chamar a ambulância para me internar explico.

Uma das consequências da reabilitação do período esclavagista no Brasil foi a presunção de que os escravos foram uma importante fonte da gastronomia brasileira. Esse mito, a que alguns chamam “mito modernista” é hoje posto em causa pela constatação que os escravos comiam a ração imposta pelo senhor, cuja mais importante característica seria ser barata.

E embora a influência africana se pudesse observar nalguns locais onde as escravas teriam a tarefa de cozinheiras na “casa grande”, nunca teria sido com tanta generalidade que permitisse extrapolar a origem de um prato como a “feijoada”, tão difundido no país.

Aquilo a que os nossos irmãos brasileiros chamam “feijoada” é uma fórmula europeia adaptada ao Brasil.

A mais provável origem do prato é o cozido europeu, onde já se misturavam diversos tipos de carnes. Os portugueses reproduziram esta receita usando o feijão preto, que era uma base importante da alimentação no Brasil da época. Esta tradição europeia do cozido (portuguesa, espanhola, italiana, francesa, etc…) foi adaptada às condições dos trópicos e ao que ali existia como ingrediente culinário, nascendo assim a “feijoada”.

Termino citando o Professor Carlos Dória, que aqui nos deixa matéria para pensar (enquanto comemos):

 “A simbologia da feijoada é a de um prato miscigenado, como se a nossa culinária fosse fruto de 'contribuições' de índios, negros e brancos. Mas isso é um mito. O papel desse mito é apagar da nossa memória de nação as relações de dominação que presidiram ao conjunto: o branco senhor, o negro escravo, o índio massacrado. Na feijoada, se esquece tudo isso, não é?"

E eu acrescento, se não é deveria ser!

Manuel Luar

Imagem: Engenho de Açúcar, de Johan Moritz Rugendas, 1835

Se este artigo te interessou vale a pena espreitares estes também

3 Abril 2020

Bem Comer: A carne é fraca. Número 10

27 Março 2020

Bem Comer: A carne é fraca. Número 9

20 Março 2020

Bem Comer: A carne é fraca. Número 8

13 Março 2020

Bem Comer: A carne é fraca. Número 7

6 Março 2020

Bem Comer: A carne é fraca. Número 6

28 Fevereiro 2020

Bem Comer: A carne é fraca. Número 5

21 Fevereiro 2020

Bem Comer: A carne é fraca. Número 4

14 Fevereiro 2020

Bem Comer: A carne é fraca. Número 3

7 Fevereiro 2020

Bem Comer: A carne é fraca. Número 2

31 Janeiro 2020

Bem Comer: A carne é fraca. Número 1

Academia: cursos originais com especialistas de referência

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Introdução à Produção Musical para Audiovisuais [online]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Fundos Europeus para as Artes e Cultura I – da Ideia ao Projeto [online]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Iniciação ao vídeo – filma, corta e edita [online]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Jornalismo e Crítica Musical [online]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Viver, trabalhar e investir no interior

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Desarrumar a escrita: oficina prática [online]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Artes Performativas: Estratégias de venda e comunicação de um projeto [online]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Gestão de livrarias independentes e produção de eventos literários [online]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Escrita para intérpretes e criadores [online]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Comunicação Cultural [online]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Patrimónios Contestados [online]

Duração: 15h

Formato: Online

30 JANEIRO A 15 FEVEREIRO 2024

Jornalismo Literário: Do poder dos factos à beleza narrativa [online]

Duração: 15h

Formato: Online

Investigações: conhece as nossas principais reportagens, feitas de jornalismo lento

02 JUNHO 2025

15 anos de casamento igualitário

Em 2010, em Portugal, o casamento perdeu a conotação heteronormativa. A Assembleia da República votou positivamente a proposta de lei que reconheceu as uniões LGBTQI+ como legítimas. O casamento entre pessoas do mesmo género tornou-se legal. A legitimidade trazida pela união civil contribuiu para desmistificar preconceitos e combater a homofobia. Para muitos casais, ainda é uma afirmação política necessária. A luta não está concluída, dizem, já que a discriminação ainda não desapareceu.

12 MAIO 2025

Ativismo climático sob julgamento: repressão legal desafia protestos na Europa e em Portugal

Nos últimos anos, observa-se na Europa uma tendência crescente de criminalização do ativismo climático, com autoridades a recorrerem a novas leis e processos judiciais para travar protestos ambientais​. Portugal não está imune a este fenómeno: de ações simbólicas nas ruas de Lisboa a bloqueios de infraestruturas, vários ativistas climáticos portugueses enfrentaram detenções e acusações formais – incluindo multas pesadas – por exercerem o direito à manifestação.

Shopping cart0
There are no products in the cart!
Continue shopping
0