Uma vez por semana uma pessoa da cultura ou mesmo um colaborador do Gerador recomenda coisas para fazer em casa. Um filme, um livro, um disco, uma série, uma conta de Instagram e uma das nossas reportagens que vale a pena reler. Hoje é a vez do nosso Ricardo Ramos Gonçalves.
É no Gerador, onde trabalha como jornalista, que o Ricardo tem encontrado um espaço que lhe permite estar envolvido em projectos artísticos que escapam às próprias fronteiras do universo da comunicação. Essa itinerância de áreas entre as quais tenta construir pontes nota-se também nas áreas que mais lhe interessam e que tem vindo a estudar, seja a comunicação, a história, o cinema ou a literatura. Aficionado da descentralização, salienta-se o dado biográfico de que é natural de Castelo Branco, por inerência albicastrense, uma importante distinção.
Fica com as sugestões do Ricardo, aqui:
UM FILME
Varda par Agnès (2019), de Agnès Varda
Quantos cineastas não desejariam ter a possibilidade de rodar um filme que pudesse funcionar como súmula da obra que desenvolveram ao longo de anos? Ainda que de forma não propositada, o documentário Varda par Agnès antecede o desaparecimento da cineasta e resume de forma brilhante o percurso e o seu método de trabalho.
Tal como a própria autora salienta no princípio do filme, as palavras "inspiração, criação e partilha" foram os motes necessários para a criação de uma filmografia que nos vai sendo apresentada através de pequenos trechos. Um pleno exercício de revisitação.
UM LIVRO
Crónica dos Sentimentos, Volume 1: Histórias de Base, de Alexander Kluge
Por diversas razões, este título lançado pela BCF Editores é um milagre da edição a vários níveis: pela primeira vez temos em Portugal a tradução de um autor seminal da cultura contemporânea alemã mas também europeia. Por outro lado, trata-se de uma antologia de textos e fragmentos que o próprio autor – conhecido sobretudo como cineasta – acompanhou de perto, integrando inclusive novos textos para a versão portuguesa.
O resultado final traduz-se numa espécie de livro-mundo, sem género catalogável, onde temas como a história, o cinema ou artes dialogam permanentemente entre si. Além disso, sendo um livro com mais de 500 páginas, é de sublinhar o notório cuidado no processo de edição do mesmo, que se apresenta sob formato de livro de bolso, compacto e, por isso, muito “amigo” da sua leitura.
UM DISCO
Henryk Górecki: Symphony nº3 (Symphony Of Sorrowful Songs) — Performed by Beth Gibbons & The Polish National Radio Symphony Orchestra
Talvez seja dos tempos que vivemos, mas juntar a voz de Beth Gibbons à Sinfonia nº3 do compositor polaco Górecki seja um exercício de tal intensidade que não sabíamos que precisávamos tanto. A vocalista dos Portishead não é uma soprano de aprendizagem formal, mas nem por isso esta interpretação, conduzida pela Orquestra Sinfónica da Rádio Nacional Polaca, deixa de ser marcante, face a uma das sinfonias mais reconhecíveis da segunda metade do século XX. Uma colaboração que deve ser vista e revista – o concerto está também disponível em vídeo –, mas sobretudo escutada.
UMA SÉRIE
Five Came Back, de Laurent Bouzereau, baseado no livro de 2014 Five Came Back: A Story of Hollywood and the Second World War do jornalista Mark Harris
O advento da Segunda Guerra levou cinco dos grandes cineastas da clássica Hollywood – Capra, Ford, Huston, Wyler e Stevens – a abandonaram as suas produções e mordomias para contribuírem de alguma forma para o esforço do país, à época em diferentes frentes de combate.
Este documentário independente, posteriormente transformado em mini-série pela Netflix, acompanha a história do cinema de propaganda americano na Segunda Guerra Mundial, pela retrospetiva dos trabalhos singulares que estes criadores nos deixaram.
UMA CONTA DE INSTAGRAM
NITCH (@__nitch)
À primeira vista pode parecer apenas mais uma página com fotos bem escolhidas de personalidades que mais ou menos reconhecemos das diferentes áreas artísticas. No entanto, existe uma sensibilidade nessa curadoria fotográfica que se faz normalmente acompanhar de citações das figuras retratadas. Um espaço para se perder umas boas horas, em reflexão e descoberta.
UMA REPORTAGEM DO GERADOR QUE VALE A PENA RELER
Uma viagem ao país estrangeiro que é o passado, pela mão de Pacheco Pereira, pela Carolina Franco
O trabalho da Ephemera, associação cultural, onde se integra um arquivo e uma biblioteca, enceta um diálogo essencial entre o passado e o presente de Portugal. Pela mão de José Pacheco Pereira e de outros fiéis colaboradores, ali se materializa um plano de reflexão onde “não se excluem partidos políticos, ideologias ou períodos históricos”.
Felizmente para nós, essa memória coletiva de uma realidade que por vezes parece paralela à nossa própria existência, foi vivida, relatada e devidamente contextualizada pela Carolina Franco. E como bem nos diz, a “chave para o conhecimento local não está lá, mas o portal para múltiplas leituras sobre o mundo, e sobretudo sobre o país, pode estar”. Passemos à leitura e que isso nos provoque um novo olhar sobre a importância do trabalho arquivístico.
Voltamos para a semana com mais sugestões fresquinhas!