Entramos em Junho, pelo que se justifica uma referência nestas crónicas aos Santos Populares, que trazem arraiais e diversão por todo o país nas noites de Santo António, de S. João e de S. Pedro.
O povo sai à rua para petiscar, beberricar e dançar. O cheiro a manjericos está no ar, tudo isto é desculpa (se a noite amena convidar) para namoricos e enleios, aos quais Santo António dá o mote.
Em Lisboa, de 12 para 13 de junho, celebra-se a noite de Santo António com marchas organizadas de acordo com um tema histórico ou referente ao respetivo bairro. É uma tradição muito antiga, embora a formalização se tenha dado a partir de 1932, quando foi instituído um prémio para a melhor marcha do ano. Não mais parou de crescer esta manifestação etnográfica dos festejos de Santo António, até chegar aos atuais desfiles e exibições na Avenida da Liberdade, patrocinados pela autarquia.
No Porto, de 23 para 24 de junho, celebra-se o S. João, feriado municipal desde 1911. As cascatas são-joaninas (provavelmente originadas pela tradição dos presépios) invadem a cidade e as crianças angariam donativos junto delas, para os “bonecos” do ano seguinte. É nesta cidade que podemos observar com mais frequência o costume de bater na cabeça de quem passa com martelinhos de plástico ou com o alho-porro.
A 29 de junho celebra-se o S. Pedro, santo pescador especialmente venerado pela gente do mar, com especial destaque para a Póvoa do Varzim e para muitas localidades dos Açores.
Em todos estes feriados, qualquer que seja o local do país, a gastronomia vem para a rua e é na rua que se come e bebe: caldo-verde, pimentos assados, chouriço assado, broa e vinho do ano. E sempre a sardinha.
Nestas exéquias dos santos populares a ”santa-rainha” é a sardinha. Que, de acordo com a sabedoria do povo, se dirige ao frade António da seguinte forma:
Ó meu santo de Lisboa
Diz-me qu'a vida não é só nadar
Queria um homem que me achasse boa
Que me soubesse saborear
Estas “bichas” costumavam ser vistas em grandes cardumes pelos mares da Sardenha, daí seu nome, e aqui em Portugal acostavam mais gordas para nosso consolo nos meses de Verão. Dizem os entendidos do IPMA:
“A sardinha (Sardina Pilchardus) acumula gordura desde o final da primavera até meados do outono (setembro-outubro) para crescer e sobretudo para ter energia para produzir os ovócitos e espermatozoides necessários à reprodução durante os meses seguintes…”
Por outro lado - e é sempre assim, quando o pobre repara que a manteiga baixou de preço logo acontece que o pão aumenta a seguir - a sardinha que era outrora tão abundante está em risco. Segundo a mesma fonte, a biomassa do stock de sardinha tem diminuído desde 2006 e encontra-se atualmente no mínimo histórico. Sardinha no Verão? Verão mas é a boa sardinha pelo canudo…Mas haja Alma até Almeida!
Existe alguma mitologia profana na arte de comer as primeiras sardinhas do ano. Cada português terá a sua versão deste banquete proletário, pelo que não estranharão que dê aqui a minha.
Para acompanhar a sardinha não devemos esquecer as duas saladas obrigatórias: uma travessa de salada mista com alface, tomate e cebola, e outra só de pimentos com alho cru.
A batata, sempre de boa qualidade, deve ser cozida com a casca. E não se deve temperar com azeite no prato. Pomos a salada por cima das batatas e o tempero daquela já será suficiente para adubar as outras.
É fundamental ter bom pão, casqueiro. Bem cozido. Cortado em fatias longas para aparar a sardinha por baixo para quem prefere passar ao lado das batatas.
E, por fim, o vinhão (casta tinta do Minho) um verde tinto fresco para acompanhar.
São escolhas sempre boas: “OPPaco”, da conhecida marca “Soalheiro”, Pardusco” 2015 de Anselmo Mendes e, do mesmo Anselmo Mendes, “Vinhão Escolha” 2016.
Recomendo que não se deixem tentar pelas sangrias. Sangria é boa para o final da tarde, para conversar em boa companhia.