O pensamento reprimido, contestado, perseguido e muitas vezes anulado por um pai nosso e um chicote. O pensamento que tinha sido encarcerado, brutalizado, asfixiado, respirou com violência quando chegou Abril. Quase se transformou num pensamento novo em Novembro de 75. A liberdade baralhou as emoções e houve brilho nos olhos molhados de quem a viu chegar. A voz faltou nesse dia. Os braços abraçaram nesse dia. O espírito cavalgou solto como um cavalo sem rédeas cortando o vento, livre e selvagem na estepe. O pensamento já não precisava esconder-se no escuro. O pensamento, agora podia estar ao sol. Na praia, na cidade, nos bares da cidade, nos cafés, nos bailes, em grupo, nas farras e nas passadas n'areia dos musseques, nas bocas das pessoas de bem e nas bocas das putas, nas bocas dos cipaios, no próprio espírito e no corpo. O pensamento era livre. O pensamento, criou e desenvolveu a palavra, educou-a, deu-lhe significados. E a palavra começou a andar rápido, nem engatinhou, crescia rápida e saudável. A medida que o próprio pensamento amadurecia, mais sagaz. Mais acutilante. Mais exigente. Mais livre. Mais incómoda, se tornava a palavra. Até chegar Maio 27 truculento, calando a palavra, perseguindo o pensamento.
Muita gente perdeu muita gente. Os mortos vivos não conseguiram enterrar os seus mortos.
Enquanto crescia só se podia sussurrar sobre este assunto, era e segue sendo o tabu nacional. As feridas precisam ser saradas, os olhos precisam de se confrontar, a boca precisa dizer o que esconde a alma. O perdão tem que ser pedido e dado, para aliviar as almas atormentadas ao longo dos anos.
Um carinhoso abraço para quem sofreu nesse dia. Viva o pensamento Livre.